Internacional Comunista (K.A.I.)

Linhas de Orientação da K.A.I.[1]

A Terceira Internacional

1. A III Internacional é uma criação russa, uma criação do partido comunista russo. Foi fundada para apoiar a revolução russa, isto é, uma revolução em parte proletária, em parte burguesa.

2. Como resultado do caráter dual da revolução russa – na medida em que a III Internacional devia apoiar tanto a revolução russa proletária como a revolução russa burguesa – portanto, também em virtude do caráter dual do seu objetivo, a III Internacional tornou-se uma organização em parte proletária, em parte capitalista.

3. Na medida em que esta apelava para a revolução, para a expropriação dos capitalistas, era, sem dúvida, uma organização proletária voltada para a supressão do capitalismo; mas quando mantinha o parlamentarismo, os sindicatos, a ditadura do partido e a ditadura dos chefes, não passava de uma organização burguesa criada para conservar o capitalismo e reconstruí-lo. Porque o parlamentarismo, os sindicatos e a ditadura dos chefes conduzem, não ao comunismo, mas à manutenção do capitalismo.

4. A III Internacional foi deste modo e desde o início uma organização em parte contrarrevolucionária.

5. Nos países europeus tal organização também não conduziu à vitória do proletariado, mas à sua derrota.

6. E agora que, desde a primavera de 1921, o partido bolchevique, o qual exerce a sua ditadura sobre a Rússia – passou ao capitalismo, passou imediatamente a exercer pressão sobre a III Internacional no sentido de um retorno ao capitalismo, a III Internacional tornou-se, de fato, capitalista e burguesa.

7. Como o capitalismo russo deve ser reconstruído e como este capitalismo não pode fazê-lo sem que a reedificação do capitalismo europeu avance, a III Internacional foi forçada a abandonar a revolução e a enveredar pelo reformismo, ou seja, a ter como objetivo a reconstrução do capitalismo.

8. Para edificar o capitalismo, também a III Internacional – do mesmo modo que o partido bolchevique, agora capitalista, estabelece relações com os governos e com o capitalismo europeus para reconstruir o capitalismo russo – reata relações com a II Internacional, a Internacional 2 ½[2], para benefício da reedificação do capitalismo europeu.

9. O objetivo da II Internacional, da Internacional 2 ½ e da III Internacional é o mesmo: o objetivo dos Estados e dos governos capitalistas. A frente única dessas três internacionais é a frente única com o capitalismo.

10. Enquanto que, por um lado, o capitalismo se encontra perante uma crise mortal e não tem outra saída, por outro, o governo soviético e a III Internacional propõem-se salvá-lo.

11. Tudo isto demonstra que a III Internacional, assim como o partido bolchevique russo, se tornaram organizações contrarrevolucionárias, traidoras da causa do proletariado. É necessário, por isso, acrescentá-la ao mesmo lote de que fazem parte a II Internacional e a Internacional 2 ½.

12. Do mesmo modo que o proletariado de todos os países não passa de um instrumento nas mãos dos partidos socialdemocratas, burgueses e reacionários para manter o capitalismo, reconstruí-lo e propagá-lo no mundo, permitindo o governo e o poder destes partidos e dos seus chefes, também o proletariado é agora um instrumento nas mãos da III Internacional e com a mesma finalidade. O seu objetivo não é a revolução, a libertação do proletariado, mas o poder pessoal no Estado burguês e a escravatura do proletariado.

A Internacional Comunista Operária

1. Quanto mais a situação do conjunto do proletariado internacional, no quadro do capitalismo mundial em crise, exige a revolução proletária como concretização da sua atual tarefa prática, menos as disposições intelectuais e as relações organizativas da classe operária mundial correspondem a essa exigência histórica. A maioria esmagadora do proletariado encontra-se prisioneira das formas de pensar da propriedade privada burguesa e das formas de colaboração internacional de classe entre o capitalismo e o proletariado, formas que, cada uma a seu modo – ainda que se trate de um processo unificado – infestam todas as organizações do proletariado existentes. Ora, tal situação coloca os proletários de todos os países perante a inevitável missão histórica de fundar uma nova internacional proletária.

2. Esta nova internacional proletária, a Internacional Comunista Operária, representa a mais autêntica luta de classe proletária, cuja tarefa prática é a abolição da propriedade privada burguesa-capitalista e a consequente transformação desta em propriedade comum proletária-socialista. Para além deste objetivo, luta fundamentalmente para a concretização da sociedade comunista.

3. Reconhecendo que as condições objetivas são fornecidas pelo derrubamento da burguesia e pela dominação do proletariado, coloca em primeiro plano da sua atividade o princípio do desenvolvimento da consciência de classe do proletariado, ou seja, quer levar o proletariado a reconhecer que ele é historicamente necessário à eliminação imediata do capitalismo, esforçando-se, por isso, em despertar nele a vontade efetiva de fazer a revolução proletária.

4. A realização de tais finalidades exige como condição prévia o caráter abertamente anti-capitalista (do ponto de vista da forma e do conteúdo) da sua organização e da direção de toda a luta. O seu mais alto objetivo não são os interesses particulares de grupos operários nacionais tomados isoladamente, mas o interesse comum do conjunto do proletariado mundial: a revolução proletária mundial.

5. Como primeiro passo no caminho que conduz ao seu objetivo, esforça-se por conseguir a proclamação da ditadura de classe do proletariado sob a forma da destruição dos poderes estatais capitalistas e da instauração de poderes estatais proletários (Estado dos conselhos). Rejeita todos os métodos de luta reformistas e combate com as armas anti-parlamentares e anti-sindicais da luta da classe proletária-revolucionária e de organizações revolucionárias de empresa (Uniões Operárias).

6. Em particular, combate as atuais organizações internacionais do proletariado (as Internacionais de Londres, Viena e de Moscou) as quais, enquanto cúmplices da burguesia no seu esforço comum para reconstruir o capitalismo mundial, se empenham em realizar a frente única da burguesia e do proletariado contra a revolução proletária, mundial, e representam, por isso, o mais perigoso obstáculo para a libertação do proletariado.

(Kommunistisch Arbeiter – Zietung Richtung) (“Jornal Comunista Operário” – tendência de Essen), 1922, n. 1.


[1] KAI: Internacional Comunista Operária. O seu aparecimento coincide e acelera a decomposição do KAPD (1922). Após o revés de Moscou, o Comitê Central do KAPD decide preparar a fundação de uma quarta Internacional, a qual agruparia os grupos “de esquerda” de todos os países. Mas como semelhante projeto absorvia muita energia ao partido, a maioria dos membros da organização pronunciaram-se rapidamente contra, exigindo, isso sim, que todos os esforços fossem feitos para desenvolver na Alemanha em primeiro lugar o próprio KAPD. Disto resultou uma oposição entre partidários da KAI (a direção do KAPD) e todos aqueles que achavam que tal fundação era prematura e estavam decididos a voltarem-se para as lutas salariais, as quais regressam ao primeiro plano depois das insurreições. Tal situação conduz à cisão do KAPD em Março de 1922, entre a maioria “pragmatista” (tendência de Berlim) e uma ínfima minoria, dita “dogmática” (tendência de Essen), que incluía a maior parte dos intelectuais do KAPD e o próprio Gorter. Estes fundaram a KAI após a cisão, aderindo a ela alguns grupos (o partido comunista operário da Bulgária, com cerca de 1000 membros, o da Holanda, e diversos pequenos grupos). Muito reduzida por ocasião do seu primeiro congresso, a KAI vai-se tornando cada vez menor e acaba por tornar-se num pequeno secretariado que emite textos de tempos a tempos. Ver Gorter: Die Kommunistische Arbeiter Internationale, 1923 (editado por Kommunismen, Post Boks 61 1880 Bagsvaerd (Dinamarca). Ver Bibliografia.

[2] Internacional 2 ½: nome irônico dado pelos bolcheviques à União de Viena (O. Bauer, Kautsky, Bernstein, etc.) a qual reagrupou, entre 1921 e 1923, o que restava dos partidos centristas após a admissão dos “grandes partidos” na III Internacional. Também dela faziam parte certos mencheviques russos, os quais voltam à II Internacional em 1923.

O presente texto foi retirado do seguinte livroA Esquerda Alemã (1918-1921): “Doença Infantil” ou Revolução?, Denis Authier: Afrontamento, 1975.