Anarquismo vs. Marxismo – Ulli Diemer

Original in English: Anarchism vs. Marxism

Nota do Crítica Desapiedada: Sugerimos também a leitura do artigo Marx, Bakunin e a questão do autoritarismo, de David Adam, como complemento ao artigo de Ulli Diemer.

Introdução – Root & Branch

Estamos republicando dois artigos de Ulli Diemer – Anarquismo vs. Marxismo e O Debate em Curso: Bakunin vs. Marx – que apareceram pela primeira vez no jornal Red Menace [Ameaça Vermelha] 2:2[1]. De maneira clara e concisa, eles confrontam os principais equívocos anarquistas sobre o marxismo e demonstram a relevância destas questões para os socialistas libertários hoje. Contudo, há um ponto fraco importante no artigo Bakunin vs. Marx. Ao demonstrar que Marx não é um determinista econômico, Diemer quase chega a negar o materialismo de Marx. O conflito entre materialismo e idealismo foi central para o debate entre Marx e Bakunin. Mais significativamente, ele permanece importante para as nossas próprias tentativas de esclarecer as dificuldades e possibilidades da ação revolucionária.

Tanto o idealismo quanto aquilo que podemos chamar de materialismo vulgar desconectam as ideias do processo de transformação ativa dos indivíduos do seu ambiente natural e social. Para o último, os indivíduos são os receptores passivos de ideias forçadas sobre eles desde o exterior; para o primeiro, as concepções se desenvolvem segundo sua própria lógica, e aqui também elas “acontecem” às pessoas, ao invés de serem desenvolvidas pelos indivíduos no desenrolar do tratamento de seus problemas e oportunidades. Em consequência desta semelhança, ambas as orientações tenderam a ver as ideias transformadoras como a propriedade de elites instruídas. Uma vez que não possui qualquer explicação para a origem das ideias, exceto das ideias mais antigas, o idealismo dá àqueles que possuem as ideias “corretas”, em qualquer época, um papel-chave na confecção da História. Nesse terreno, o idealista e o materialista não-dialético chegam a um acordo sobre a necessidade de se colocar as rédeas da ação nas mãos dos poucos que, por uma ou outra razão, estão afinados com as necessidades objetivas da situação.

É assim que Lênin, o materialista filosófico, era politicamente um completo idealista, acreditando que a ideia de socialismo poderia se desenvolver apenas nas mentes expostas a uma educação superior, e nunca entre os operários, atrelados às suas necessidades imediatas. De forma similar, Bakunin acreditava na necessidade absoluta de uma organização de elite que pudesse controlar e guiar o movimento do povo, cujos pensamentos disformes apenas a Aliança anarquista (e sobretudo ele, Bakunin) poderia articular.

Se, por um lado, tais pontos de vista podem ser bastante inspiradores para uma elite intelectual, eles não têm qualquer utilidade para o resto de nós. É a este problema que Marx estava se dirigindo quando ele escreveu nas Teses Sobre Feuerbach que “o próprio educador precisa ser educado”. Marx, em contraste com os idealistas de esquerda que ele criticava (Proudhon, Lassalle, Bakunin), não viu o problema da revolução como o de elaborar planos para outros executarem. Suas ideias e, posteriormente, teoria desenvolveram-se a partir de suas experiências e estudos dos movimentos do proletariado emergente. Ele observou que essa classe, ao contrário do campesinato, estava integrada sob vastas áreas, pois ela produzia para o mercado nacional ou mundial em vez do consumo local. Consequentemente, o que acontecia aos operários numa área tendia a afetar operários noutra. Mas esse estado de coisas era igualmente relativo. Em tempos de expansão capitalista e prosperidade, as lutas operárias por melhores salários, melhores condições de trabalho, e mesmo por objetivos políticos podiam permanecer mais ou menos localizadas. Por outro lado, as crises capitalistas jogavam a classe trabalhadora em geral em condições semelhantes, condições (demissões em massa, cortes salariais e miséria generalizada) que não poderiam ser ignoradas, nem combatidas a nível de pequenos grupos. Elas só poderiam ser combatidas coletivamente e cooperativamente.

Marx estudou a origem e o desenvolvimento do proletariado a fim de esclarecer o significado do ideal do socialismo, que avança em períodos de crise. Sua análise do capitalismo o levou a concluir que o sistema tornaria-se dominante mundialmente, que o proletariado tornaria-se a grande maioria da população nos países de capitalismo desenvolvido, e que o ciclo contínuo de crise ficaria assim mais severo e envolveria números cada vez maiores de pessoas. Em algum momento da História, supôs ele, a classe trabalhadora mundial seria tão grande e a crise tão profunda, que a atividade direta e coletiva do proletariado passaria da resistência à revolução, expropriando os capitalistas e criando uma sociedade sobre a base da “associação livre e igual dos produtores”. Estas previsões basearam-se em parte em observações empíricas, e em parte na abstração científica a partir de tais observações[2]. Apenas desta forma a teoria poderia ser um guia para ação, em vez de uma justificativa ideológica ou de um programa para outros executarem. Foi a fim de ajudar os seus camaradas a mudar o mundo – os trabalhadores –, a realizarem as suas capacidades coletivas, que Marx queria “desnudar as leis[3] de movimento da sociedade capitalista” no Capital. Ele queria compreender, e assim ajudar os outros a compreender, as realidades sociais que tornam possíveis novas formas de ação social e as novas formas de pensamento que tais ações envolvem. Era este o conteúdo do materialismo de Marx – a explicação da origem e do conteúdo das ideias socialistas em termos da dinâmica estrutural do capitalismo.

O modelo marxiano é, quando muito, mais relevante hoje em dia do que o foi na época de Marx, quando grandes porções do mundo encontravam-se ainda intocadas pelo capitalismo e a classe operária era uma pequena minoria até nos países de capitalismo mais desenvolvido. No tempo presente, é verdade, o movimento operário revolucionário atingiu um ponto particularmente baixo. As organizações oficiais de esquerda – partidos e sindicatos – dedicaram-se aos interesses do capitalismo ou da sua forma análoga, governada pelo partido nas nações “socialistas”. E, ainda assim, a classe operária internacional, maior do que nunca, e mais intimamente ligada através de sua dominação ao mercado mundial, enfrenta as mesmas condições e necessidades que Marx percebeu há um século. O atual declínio econômico indica que a intervenção do governo na economia não tornou a crise capitalista obsoleta; é antes a crise que está tornando obsoletas aquelas teorias – compartilhadas nos anos 1960 por ideólogos burgueses e pela maioria da esquerda – que veem a crise como algo do passado. A análise do desenvolvimento capitalista, que esclarece a situação enfrentada pelos trabalhadores, não prevê nenhuma garantia de um futuro libertário. Isso depende agora, como anteriormente, da resposta dos trabalhadores às suas condições. Mas o marxismo mostra, sim, que um tal futuro não é somente um sonho utópico, mas uma possibilidade real pela qual vale a pena lutar.

Root & Branch

“… Desde o primeiro momento da vitória, a desconfiança deve ser dirigida não mais contra os partidos reacionários vencidos, mas contra os antigos aliados dos operários, contra o partido que deseja explorar a vitória comum para si mesmo… Os operários devem colocar-se ao comando, não da autoridade do Estado, mas dos conselhos comunais revolucionários que os operários terão conseguido adotar… As armas e a munição não devem ser entregues sob nenhum pretexto”.

K. Marx & F. Engels. Mensagem ao Comitê Central da Liga Comunista (1850).


Anarquismo vs. Marxismo: Algumas notas sobre um antigo tema

Um pequeno ensaio que apresenta alguns equívocos sobre o marxismo compartilhados por alguns anarquistas.

Mais de cem anos após o movimento socialista se dividir entre duas facções beligerantes, marxista e anarquista, há sinais, ao menos em pequena escala, de que os indivíduos que se autodenominam anarquistas e os indivíduos que se autodenominam marxistas ou “socialistas libertários” estão achando maneiras de trabalharem juntos de forma frutífera. As questões apresentam-se imediatamente: em que medida os velhos rótulos continuam válidos? Os seus significados terão se modificado no decorrer do último século? Quão sólida é a nova base de unidade? Terão sido as velhas divisões transcendidas?

Mas será realmente necessário reexaminar os velhos rótulos e divisões? Não seria melhor deixar polêmicas adormecidas de lado e concentrar-se simplesmente no trabalho em conjunto?

O problema é que um movimento socialista – ou movimento libertário: que termos nós podemos usar de forma válida? – que espere se desenvolver tem de confrontar questões históricas, estratégicas e teóricas. Um movimento socialista digno do nome tem de fazer mais do que se unir para ações simples. Tem de se perguntar onde ele está tentando chegar e como propõe chegar lá: precisamente as questões que provocaram o fatídico racha na década de 1870, e que manteve os movimentos separados até os dias de hoje. As questões políticas que são ignoradas não somem, apenas reaparecem mais tarde com um impacto muito mais destrutivo. Elas devem ser tratadas com franqueza.

Mas isto não significa que estejamos destinados a praticamente (re)travar velhas batalhas e reviver as cisões e hostilidades do passado. O mundo mudou muito desde os anos 1870 e a experiência do movimento socialista durante o século passado modificou imensamente os problemas que enfrentamos. Não menos importante é a revitalização de uma corrente marxista que é militantemente antileninista e a reemergência de um movimento anarco-comunista que aceita (embora não necessariamente de modo consciente) uma boa dose de análise marxista. Há um bom terreno comum sobre o qual podemos nos unir.

Deveria igualmente ser reconhecido que enquanto as diferenças entre marxistas e anarquistas são reais, com muita frequência no passado as disputas entre eles geraram mais calor do que luz. Um problema em muitas polêmicas é que cada lado tende a pegar tendências parciais do outro lado e tomá-las pelo todo, e nesse sentido deturpam. Uma análise séria tem de ir além das simplicidades da argumentação do preto e do branco (preto e vermelho?). Ao mesmo tempo, é verdade que colocar questões de forma drástica sugere um tom polêmico, então não deveríamos recuar perante a polêmica se isto significa que questões importantes serão camufladas ou ignoradas.

Minha própria posição é pró-marxista e é em muitos aspectos bastante crítica do anarquismo. É imperativo, no entanto, notar duas coisas: uma, que há muitas coisas positivas sobre o anarquismo que eu deixo não reconhecidas, pois estou a tentar, aqui e no artigo subsequente (“Bakunin vs. Marx”), criticar certos aspectos específicos da doutrina total que eu acho que a enfraquecem enormemente. Eu não pretendo aqui fazer um balanço do anarquismo como um todo. Segunda coisa: eu sou muito mais crítico do “marxismo” da maioria dos “marxistas-leninistas” do que sou do anarquismo. Enquanto eu estimo a maioria dos anarquistas como camaradas no movimento libertário, eu considero a própria expressão “marxista-leninista” como uma contradição em termos e considero o “marxismo-leninismo” como uma ideologia que é diametralmente oposta à emancipação das classes trabalhadoras[4].

Não é possível cobrir adequadamente todo o debate anarquismo/marxismo em um ou dois artigos. O que eu me proponho a fazer aqui, e nas notas complementares sobre Marx e Bakunin, é me concentrar nas objeções anarquistas mais comuns e básicas ao marxismo e examiná-las brevemente. Estas notas devem ser vistas como apenas isto – notas que tecem alguns argumentos básicos. Espero que elas provoquem uma discussão vívida que torne possível o exame das questões levantadas, e de outras, com muito mais detalhe.

O ímpeto de buscar um debate sobre marxismo e anarquismo vem primeiramente da leitura de um número de artigos publicados recentemente sobre anarquismo os quais todos parecem demonstrar uma espantosa incompreensão e ignorância de Marx e do que ele escreveu e fez. (p. ex. Bakunin on Anarchy, com prefácio de Paul Avrich e introdução de Sam Dolgoff; o artigo de Mark Brothers sobre anarquia em Open Road No. 4; o artigo On Bakunin na Open Road No. 2 e o de P. Murtaugh neste número de The Red Menace.) Todos estes – em sua maioria escritos anarquistas – despendem muitos esforços atacando algo chamado “marxismo”. Em todo caso, o “marxismo” que é atacado tem pouco ou nada a ver com as teorias de Karl Marx. Ao ler estas polêmicas contra um “marxismo” que existe basicamente nas mentes daqueles que o atacam, só se pode murmurar a frase que é dito que o próprio Marx repetia frequentemente em seus últimos anos, referindo-se somente às obras de seus “seguidores”: “Se isto é marxismo, então tudo que sei é que não sou marxista”.

Se deve haver qualquer diálogo entre marxistas e anarquistas, se os aspectos positivos e negativos dos projetos marxiano e anarquista devem ser analisados criticamente, então cabe àqueles que se opõem ao marxismo, assim como àqueles que o defendem ou que procuram revisá-lo ou transcendê-lo, ao menos saber do que estão falando. Nada é resolvido com a criação e ataque a um marxismo-espantalho.

E é importante compreender e conhecer Marx não apenas porque existem “marxistas libertários”, mas porque Marx é incontestavelmente a figura central no desenvolvimento das ideias libertárias e do socialismo. Não é possível compreender o desenvolvimento de qualquer movimento ou sistema de pensamento político de esquerda no último século sem conhecer o marxismo. De fato, não é possível compreender o desenvolvimento de qualquer ideologia neste século, ou mesmo compreender a história dos últimos cem anos, sem saber alguma coisa sobre marxismo. A história política do século XX é em grande medida uma história das tentativas de realizar o marxismo, tentativas de derrotar o marxismo, tentativas de ir além ou de alterar o marxismo, tentativas de desenvolver alternativas ao marxismo.

O anarquismo certamente não é nenhuma exceção. Ele originalmente definiu-se em oposição ao marxismo, e continua a fazê-lo nos dias de hoje. Infelizmente, os anarquistas parecem desconhecer totalmente – ou estão pouco dispostos a perceber – que o marxismo não é um monolito, que existem, e sempre existiram, correntes de pensamento extremamente diferentes que se denominam marxistas. As críticas anarquistas invariavelmente identificam o marxismo com o leninismo, o leninismo com o stalinismo, o stalinismo com o maoísmo, e todos estes também com o trotskismo. Não há normalmente nenhuma pitada de astúcia neste bocado marcante de prestidigitação intelectual – nosso anarquista médio simplesmente pensa ser um fato universalmente aceito e estabelecido que todos estes sistemas políticos são idênticos[5].

Isto não quer dizer que não se pode argumentar que todos esses sistemas políticos são fundamentalmente a mesma coisa, que suas diferenças, não importa o quão violentas, são secundárias em relação a certas características essenciais que todos eles têm em comum. Mas a questão é que é necessário defender o caso, reunir algumas evidências, conhecer um fenômeno antes de condená-lo. Não se pode simplesmente começar com a conclusão.

Mas o fato é que o marxismo não é um monolito. A despeito da afirmativa desinformada de Murtaugh, de que “o marxismo libertário é antes um desenvolvimento recente no que diz respeito a teorias políticas e movimentos”, e a despeito do fato de que o termo “marxismo libertário” seja novo – e desnecessário –, a tradição vem de longa data. Por exemplo, Rosa Luxemburgo – seguramente uma das figuras centrais em qualquer história do marxismo – já condenava as teorias de Lênin do partido de vanguarda e da disciplina hierárquica centralizada há três quartos de século, em 1904. Em 1918 – enquanto muitos anarquistas corriam para se juntar aos bolcheviques –, ela criticava os métodos ditatoriais dos bolcheviques e alertava para o aborto da Revolução Russa. Após sua morte, houve outros pensadores e movimentos que condenaram o bolchevismo como uma degeneração autoritária do marxismo: Anton Pannekoek, Karl Korsch, os comunistas de conselhos[6], a Escola de Frankfurt, até a Nova Esquerda dos anos 1960 e 1970. E mesmo dentro da tradição leninista houve pensadores que contribuíram, que desafiaram o poder da interpretação dominante e ajudaram a nutrir um marxismo libertário; por exemplo, Georg Lukács, Antonio Gramsci e Wilhelm Reich. Um conjunto de correntes libertárias emergiu do movimento trotskista nas décadas de 1940 e 1950. Qualquer movimento emancipatório que se proclame fruto de uma concepção imaculada nos anos 1970, ou que reconheça apenas uma pequena vertente anarquista como o “verdadeiro” pensamento libertário através dos tempos, enquanto se destaca – seja por conta de dogma ou de ignorância – de todas as outras correntes contribuidoras, somente se empobrece a si mesma. Ainda assim, os anarquistas que escrevem sobre marxismo parecem, deliberadamente, e de forma quase perversa, fechar os seus olhos e ouvidos a qualquer coisa, exceto à tradição leninista dominante, e assim conseguem sempre reconfirmar os seus próprios preconceitos sobre o marxismo.

Tudo isso não prova, evidentemente, que a interpretação libertária de Marx seja a correta. Mas deveria ser possível concordar em um ponto analítico básico: se há alguma dúvida sobre o que Marx defendia, então é necessário ler Marx, não tomar as palavras de quaisquer de seus inimigos ou daqueles que reivindicam, justificadamente ou não, ser os seus seguidores. Uma vez que isto é aceito, e somente então, é possível que se comece um diálogo anarquista/marxista num nível sério.

Minha própria atitude para com Marx não é inequivocamente favorável. Há, no meu ponto de vista, sérias questões a serem levantadas sobre aspectos do pensamento de Marx. O marxismo, como qualquer outra coisa, deve ser submetido à crítica, crítica que pode transcender Marx, mas não, penso eu, rejeitá-lo. “O marxismo é para nós um ponto de partida, não o nosso destino predeterminado. Nós aceitamos o ditado de Marx de que a nossa crítica não deve temer nada, inclusive os seus próprios resultados. Nossa dívida para com o marxismo não será menor se descobrirmos que temos de ir além dele”. A questão fundamental, contudo, é que o projeto marxiano deve ser o coração de qualquer política libertária. Pode ser que seja possível e, portanto, necessário transcender Marx, mas para transcendê-lo é necessário primeiramente absorvê-lo. Sem Marx e alguns dos melhores dos “marxistas”, não é possível criar uma práxis libertária e um mundo libertário.

Finalmente, ao julgarmos a obra de Marx, deve-se ter em mente que seus escritos e ações abrangem cerca de 40 anos como revolucionário; que ele escreveu cartas e fez anotações que representam visões parciais as quais ele não foi capaz de retornar e expandir; que muitas das suas obras eram polêmicas contra doutrinas particulares e são, por isso, unilaterais. Seria um erro, por conseguinte, tomar cada frase e cada citação no corpo de sua obra como uma escritura sagrada acabada, ou esperar que sua obra seja totalmente consistente, ou que ele tenha pensado as implicações de todas as suas teorias até o final. A obra de Marx é uma contribuição incompleta, irregular, mas, em grande medida, frutífera e brilhante que deve ser abordada tal como ele próprio abordava tudo: criticamente.

A esta altura, é necessário confrontar um dos trágicos defeitos do anarquismo, que o tornou incapaz de se tornar uma alternativa história séria: sua forte tendência orientada para o anti-intelectualismo. Com raríssimas exceções (por exemplo, Kropotkin, Rocker, Bookchin), o anarquismo falhou em produzir adeptos interessados em desenvolver uma análise rigorosa do capitalismo, do Estado, da burocracia ou do autoritarismo. Consequentemente, sua oposição a estes fenômenos tendeu a permanecer instintiva e emocional; quaisquer que tenham sido as análises por ele produzidas foram ecléticas, amplamente emprestadas do marxismo, liberalismo e outras fontes, e raramente de qualidade intelectual séria. Não se trata de uma fracasso acidental – não faltam anarquistas inteligentes. Mas os anarquistas, talvez repelidos pela frieza de alguns intelectuais marxistas “oficiais”, talvez por pressentirem instintivamente o germe do totalitarismo em qualquer sistema intelecutal que busque explicar tudo, têm se oposto conscientemente, e muitas vezes de forma militante, ao empreendimento intelectual enquanto tal. Sua oposição não tem sido simplesmente a análises e teorias particulares, mas à análise e à teoria enquanto tais. Bakunin, por exemplo, defendia – de uma maneira reminiscente do Papa medieval Gregório – que ensinar teorias aos operários minaria suas qualidades inerentemente revolucionárias. O que acontece quando o principal teórico de um movimento é explicitamente anti-intelectual?

O resultado para o movimento anarquista foi devastador. O anarquismo como teoria continua a ser uma miscelânea de visões amiúde conflituosas que o torna frustrante especialmente para simpatizantes críticos, pois os tópicos mais frutíferos raramente parecem vir à tona. A maioria das publicações anarquistas evitam, como se fosse a peste, qualquer discussão sobre estratégia ou qualquer análise da sociedade tal como ela é hoje. (Mesmo umas das melhores publicações anarquistas, The Open Road, permanece sendo essencialmente uma líder de torcida de qualquer coisa vagamente de esquerda ou libertária. Indivíduos que organizam sindicatos e indivíduos que se organizam contra os sindicatos recebem cobertura da mesma forma acrítica; arremesso de bombas e arremesso de tortas são vistos como formas igualmente válidas de ação, e nenhuma tentativa é feita para se discutir os méritos estratégicos relativos de um ou de outro em um dado contexto). A maioria das editoras anarquistas não parecem interessadas em nada a não ser (a) reviver a Guerra Civil Espanhola, (b) reviver Kronstadt e (c) falar mal dos marxistas-leninistas uma vez mais. Mesmo estas preocupações – que se tornaram rotineiras, de modo a fazer do anarquismo, em sua grande parte, algo simplesmente entediante – não buscam desenvolver novas visões relativas à história do capitalismo, ao processo revolucionário ou ao bolchevismo, por exemplo.

Em vez disso, os mesmos argumentos são repetidos liturgicamente. Raramente existe algum debate político sério dentro do movimento anarquista, enquanto as polêmicas contra o bicho-papão do “marxismo” (tão essencial ao anarquismo como satã é para a Igreja Católica) são geralmente prejudicadas por uma recusa de princípios em obter conhecimento de qualquer coisa sobre o que está sendo atacado. Os argumentos são em sua maioria levados a cabo em termos das mais vagas generalidades; citações nunca são usadas porque as obras do suposto inimigo jamais foram lidas.

Como consequência de seu anti-intelectualismo, o anarquismo nunca foi capaz de desenvolver seu potencial. Como um movimento que desdenha a teoria e cultua acriticamente a ação, o anarquismo segue sendo um edifício trêmulo, consistindo, essencialmente, em vários pedaços de análise marxista subjacentes a alguns preceitos táticos inflexíveis. Ele é mantido de pé principalmente por meio de impulsos libertários – o melhor tipo de impulsos para se ter, com toda a certeza – e por um medo de organização tão grande que é virtualmente impossível para os anarquistas organizarem-se efetivamente em uma base de longo prazo. Trata-se de uma verdadeira tragédia, pois o movimento libertário não pode dar-se ao luxo de ter seus membros recusando-se a usar seus intelectos na batalha para criar um mundo novo. Enquanto o anarquismo continuar a promover o anti-intelectualismo, ele não vai chegar a lugar nenhum.


Bakunin vs. Marx

Ulli Diemer discorre sobre alguns dos pontos de ruptura entre o anarquismo e o marxismo-leninismo.

Eu proponho neste artigo examinar algumas das objeções anarquistas mais comuns ao “marxismo”. As questões que eu irei destacar são todas levantadas nas obras recentes citadas no artigo precedente (Anarquismo vs. Marxismo).

Todas elas foram levantadas, em grande parte pela primeira vez, por Bakunin na época em que o anarquismo surgiu pela primeira vez como um movimento autoconsciente que se definia em oposição a todas as outras correntes na esquerda. Portanto, irei concentrar-me primordialmente em Bakunin na discussão a seguir e em algumas de suas diferenças com Marx. Embora eu entenda que Bakunin não é o único intérprete do anarquismo, creio que esta é uma abordagem válida por uma série de razões: (a) não é possível abranger tudo e todos em um pequeno ensaio; (b) o racha Bakunin/Marx foi o evento formativo na história do anarquismo; (c) Bakunin é ainda hoje o anarquista mais amplamente lido, citado e admirado no próprio movimento anarquista; (d) muitas das objeções-chave dos anarquistas ao marxismo originaram-se com Bakunin e essas objeções continuam a ser usadas hoje; na medida em que é possível colocá-las em questão, é possível também colocar em questão pré-concepções anarquistas atuais sobre o marxismo e inaugurar um diálogo genuíno.

Como os anarquistas veem o racha marxismo/anarquismo?

As seguintes crenças parecem ser aceitas de forma generalizada pelos anarquistas:

  1. Os marxistas acreditam na criação de um “Estado popular” ou um “Estado operário”; os anarquistas acreditam na abolição do Estado.
  2. “Os anarquistas almejam uma sociedade em que a verdadeira tomada de decisões envolve todos os que nela vivem”; o marxismo, ao contrário, criaria “alguns poucos fanáticos por disciplina, mexendo os pauzinhos numa pretensa ditadura do ‘proletariado’”.
  3. Marx era um “determinista econômico”;  Bakunin “enfatizava os fatores psicológicos subjetivos da revolução”. O marxismo é a viagem egocêntrica de intelectuais que tentam encaixar tudo na sua “teoria de bizantina complexidade” – o materialismo dialético – que é na melhor das hipóteses de “utilidade duvidosa” e que serve basicamente para tornar possível aos líderes marxistas estabelecerem “controle sobre o movimento”.
  4. Os anarquistas acreditam que organizações revolucionárias deveriam ser abertas, igualitárias e completamente democráticas; os marxistas, por outro lado, defendem uma “liderança hierárquica e sedenta de poder” como exemplificado no partido de vanguarda e no centralismo democrático.
  5. O racha original na I Internacional entre as facções encabeçadas por Bakunin e Marx ocorreu por conta da questão do autoritarismo; Marx expulsou Bakunin da Internacional com acusações forjadas porque Bakunin se opôs ao regime centralizado e ditatorial de Marx sobre a Internacional.
  6. O marxismo é “autoritário”; o anarquismo é “libertário”.

O que pensar destas objeções?

1. O Estado popular

Talvez não seja surpreendente que se acredite amplamente que Marx criou este conceito, dado o número de “Repúblicas populares”, “Estados operários” etc., no mundo atual que se auto-intitulam “marxistas”. Tanto os leninistas que usam este conceito quanto os anarquistas que se opõem a ele parecem desconhecer que ele não se acha em lugar nenhum nas obras de Marx. Marx, pelo contrário, rejeita-o precisamente. (Ver p. ex. Crítica do Programa de Gotha).

É revelador dos métodos de Bakunin que ele tenha acusado Marx repetidas vezes de defender um “Estado popular” (ver p. ex. Dolgoff, ed., Bakunin on Anarchy, Vintage, 1972), uma acusação que em vista da sua incapacidade de citar qualquer evidência para dar-lhe suporte (verifique as fontes e veja se Bakunin oferece alguma vez uma única citação para sustentar suas afirmações), e em vista do repúdio repetido e explícito de Marx e Engels do conceito, só pode ser interpretada como uma fabricação deliberada da parte de Bakunin. E tem-se pouco a agradecer às diversas gerações de anarquistas por terem continuado a engolir as ficções de Bakunin neste quesito, sem sequer se preocupar em procurar por evidências para suportá-las.

A posição de Marx e Engels acerca do Estado, embora não fosse livre de ambiguidades e não esteja acima de qualquer crítica, era bastante diferente do que Bakunin afirmava. Ela está enunciada mais extensivamente em A Guerra Civil na França de Marx, mas é também desenvolvida em inúmeras outras obras. O que Marx previa era que durante o período revolucionário de luta contra a burguesia, o proletariado usaria o aparato estatal para esmagar a burguesia: “para conquistar sua libertação, empregará meios que serão descartados após a libertação”. (Marx, Comentários de Marx a “Estatismo e Anarquia” de Bakunin, 1874-75). Após a destruição da burguesia, o Estado deixa de ser útil.

Marx apontava para a Comuna de Paris como algo muito próximo ao que ele tinha em mente; Bakunin também estava entusiasmado com a Comuna, mas ainda assim continuou a acusar Marx de sustentar em segredo pontos de vista diferentes. Este disparate bakuninista foi igualmente repetido por outros anarquistas. Por exemplo, o autor anarquista Arthur Mueller Lehning escreve que “É uma ironia da história que justo no momento em que a batalha entre os autoritários e os anti-autoritários na Internacional havia atingido o seu apogeu, Marx iria, com efeito, endossar o programa da tendência anti-autoritária… A Comuna de Paris não tinha nada em comum com o socialismo de Estado de Marx e estava mais de acordo com as ideias de Proudhon e as teorias federalistas de Bakunin. A Guerra Civil na França está em total contradição com todos os escritos de Marx sobre a questão do Estado” (citado em Bakunin on Anarchy, p. 260).

Eis aqui um exemplo marcante de duplipensar. A maior obra de Marx sobre o Estado é considerada como estando “em total contradição” com “todos” os seus escritos sobre o Estado!

Quais escritos sobre o Estado estaria Lehning se referindo então? Não sabemos, pois ele não diz. Como sempre nas polêmicas anarquistas, temos de tomá-lo por boa-fé. Certamente, Lehning não pode estar se referindo à Miséria da Filosofia, escrita em 1847, ou ao Manifesto Comunista, escrito em 1848, ou à Crítica do Programa de Gotha, escrita em 1875, ou às cartas privadas que Marx escreveu na mesma época que a publicação da Guerra Civil na França em 1871. Todas estas obras sustentam de forma consistente que o Estado é incompatível com o socialismo. Juntas, elas comportam a maior parte, senão “todos” os escritos de Marx acerca do Estado. Mas Lehning (e Bakunin e Dolgoff e Avrich e Brothers e Murtaugh e…) sabem melhor. Em algum lugar, em algum mundo místico conhecido apenas pelos anarquistas, há de se encontrar o verdadeiro ponto de vista de Marx sobre o Estado, o “Estado popular de Marx” (Bakunin on Anarchy, p. 318), o qual é “completamente idêntico” ao “Estado aristocrático-monárquico de Bismarck” (Bakunin on Anarchy, p. 319).

Como é que se refuta um “argumento” que, sem um único traço de evidência, exceto pela predisposição racial (“como alemão e judeu, ele (Marx) é um autoritário da cabeça aos pés” – Bakunin em 1872), sem uma única citação, atribui ideias e conceitos a Marx que Marx repetidas vezes atacou?

Existem duas alternativas: ou se engole tudo o que Bakunin, Dolgoff e cia. dizem por pura fé, pois eles são anarquistas, ou se escolhe o caminho da integridade intelectual e tenta-se descobrir a posição de Marx e Engels acerca do Estado pela leitura do que Marx e Engels disseram sobre o Estado.

Se o último é escolhido, pode-se começar pela leitura da carta de Engels a Bebel de março de 1875, na qual ele diz: “É puro disparate falar de um Estado popular livre: enquanto o proletariado ainda se utiliza do Estado, não o faz no interesse da liberdade, mas a fim de pressionar seus adversários, e tão logo se torna possível falar de liberdade, o Estado enquanto tal deixa de existir. Nós proporíamos portanto substituir Estado por Gemeinwesen, uma boa e velha palavra alemã capaz de transmitir muito bem o significado da palavra francesa ‘commune’”.

É evidentemente possível argumentar que a utilização do Estado pelo proletariado no breve período de transição é perigosa e poderia levar ao estabelecimento de um Estado permanente. Deve-se observar, entretanto, que o próprio Bakunin previa uma forma de Estado pós-revolucionário completo com eleições, delegados, um parlamento, um comitê executivo e um exército (Bakunin on Anarchy, p. 153). Os anarquistas, contudo, silenciam curiosamente a esse respeito.

No entanto, também é verdade que, em contrapartida, a preocupação que Bakunin expressava sobre a possível degeneração da revolução provou-se válida, e que Marx, por sua vez, falhou em dar atenção suficiente aos perigos representados por essa ameaça a uma futura revolução. Esta crítica, porém, deve ser ela própria habilitada de diferentes maneiras; e isso está certamente muito distante das alegações de Bakunin e dos anarquistas de que o marxismo era uma teoria que visava subjugar a sociedade ao Estado.

2. Ditadura do Proletariado

Uma questão intimamente relacionada é a da ditadura do proletariado, um dos termos mais abusados e mal compreendidos de todo o marxismo. A questão da transição do capitalismo ao socialismo, e a visão que Marx tinha sobre isso, é uma questão extremamente complicada que não pode ser abordada em alguns poucos parágrafos. Mas o ponto aqui é simplesmente nos livrarmos dos mal-entendidos mais grosseiros sobre o termo, incentivados por sua apropriação pelos bolcheviques e pelo fato relacionado de que a palavra ditadura passou a ter um significado bastante diferente hoje em dia do que aquele que tinha na época de Marx. Como coloca Dolgoff, havia, então, um “sentido amplo no qual o termo ‘ditadura’ era usado pelos socialistas do século XIX para designar simplesmente a influência preponderante de uma classe, tal como na ‘ditadura do proletariado’ de Marx” (Bakunin on Anarchy, p. 12).

Ou, para ser mais preciso, a ditadura do proletariado significa o domínio do proletariado enquanto classe e a supressão da burguesia enquanto classe. Ela é perfeitamente compatível com a mais profunda democracia no seio da classe trabalhadora e de fato a pressupõe. A melhor breve exposição do conceito marxiano, e de como ele difere da concepção leninista de ditadura, deriva da polêmica de Rosa Luxemburgo de 1918 contra os bolcheviques:

 “Nós sempre distinguimos o núcleo social da forma política da democracia burguesa; nós sempre revelamos o núcleo duro da desigualdade social e ausência de liberdade escondidos sob o doce invólucro da igualdade e liberdade formais – não com o objetivo de rejeitar estas últimas, mas de incitar a classe operária a não satisfazer-se com o invólucro, mas antes, através da conquista do poder político, criar uma democracia socialista para substituir a democracia burguesa – não para eliminar a democracia completamente.

Mas a democracia social não é algo que começa apenas na terra prometida depois que os fundamentos da economia socialista são criados; ela não provém como algum tipo de presente de natal para as pessoas dignas as quais, nesse ínterim, ofereceram apoio leal a uns quantos ditadores socialistas. A democracia socialista começa simultaneamente com o início da destruição da dominação de classe e da construção do socialismo. Ela começa no exato momento da tomada do poder pelo partido socialista. É a mesma coisa que a ditadura do proletariado.

Sim, ditadura! Mas esta ditadura consiste na maneira de aplicar a democracia, não na sua eliminação, em ataques enérgicos e resolutos sobre os direitos e as relações econômicas bem entrincheiradas da sociedade burguesa, sem os quais uma transformação socialista da sociedade não pode ser alcançada. Mas esta ditadura deve ser obra da classe, e não de uma pequena minoria dirigente em nome da classe – isto é, deve prosseguir passo a passo da participação ativa das massas.” (Rosa Luxemburgo, The Russian Revolution, Ann Arbor paperback, p. 77-78).

3. “Determinismo Econômico”

A questão do materialismo marxiano e a ênfase de Marx nas relações de produção é novamente uma questão extremamente difícil que não pode simplesmente ser abordada inteligentemente em um breve artigo. Neste ponto, é possível dizer apenas que ela levanta problemas difíceis que têm de ser seriamente analisados. Contudo, enquanto um reexame da teoria de Marx e das contradições nela admitidas estão na ordem do dia, é preciso dizer que a forma com que os anarquistas tipicamente a retratam e as suas objeções direcionadas contra ela são equívocos mal informados que contribuem menos do que nada para a discussão. Por exemplo, Marx não era um determinista econômico; ele rejeitava o determinismo econômico e o que ele chamou de “materialismo vulgar” descontrolado. Ele não tentava reduzir todos os fenômenos a fenômenos econômicos; basta ler qualquer de suas obras políticas para saber isto.

Como disse Engels, “De acordo com a concepção materialista da história, o elemento em última análise determinante na história é a produção e reprodução da vida real. Mais do que isso, nem Marx nem eu jamais afirmamos. Assim, se alguém distorce isto ao dizer que o elemento econômico é o único determinante, ele transforma aquela proposição em uma frase abstrata sem sentido” (carta a Joseph Bloch, 21-22 de setembro, 1890, in Lewis Feuer, ed., Marx and Engels: Basic Writings on Politics and Philosophy, p. 397-398).

Anarquistas como Paul Avrich, entretanto, tem sua própria visão do que “Marx realmente quis dizer”. Veja como Avrich contrasta de forma grosseira os pontos de vista de Marx e Bakunin: (Bakunin) “rejeitava a visão de que a transformação social dependia do desenvolvimento gradual das condições históricas ‘objetivas’. Ele acreditava, ao contrário, que os homens moldam os seus próprios destinos…”.

É lamentável que Avrich nunca tenha lido, por exemplo, a terceira tese sobre Feuerbach de Marx: “A doutrina materialista (de Feuerbach) de que os homens são o produto das circunstâncias e da educação, e de que, portanto, os homens modificados são o produto de outras circunstâncias e de uma educação modificada esquece que são os homens que mudam as circunstâncias e de que o próprio educador precisa ser educado”. Ou A Sagrada Família: “A História não faz nada, ela ‘não possui imensas riquezas’, não ‘trava batalhas’. São os homens, os homens vivos, reais, que fazem tudo isto, que possuem as coisas e travam batalhas. Não é a ‘História’ que usa os homens como um meio de alcançar – como se fosse uma pessoa individual – seus próprios fins. A História não é nada senão a atividade dos homens perseguindo de seus próprios fins” (Bottomore, ed., Karl Marx, Selected Writings in Sociology and Social Philosophy, Pelican p. 78).

4.5.6. A Natureza da Organização Revolucionária; Autoritarismo e Liberdade

Estas também são questões muito complicadas: é impossível fazer justiça aos pontos de vista seja de Marx, seja de Bakunin em um artigo curto e bastante controverso que visa contestar alguns graves equívocos, no lugar de analisar e criticar suas ideias e práticas de forma detalhada e rigorosa. É preciso compreender, antes de tudo, que as ideias tanto de Marx quanto de Bakunin, tal como foram expressas em seus escritos, são contraditórias em certos aspectos; nem Marx, nem certamente Bakunin foram totalmente consistentes ao longo de suas vidas. Em segundo lugar, a prática de ambos esteve por vezes em desacordo com o que eles defendiam. Nenhum dos dois sempre foi capaz de estar à altura dos critérios estabelecidos. Ambos exibiam traços de arrogância e autoritarismo em suas próprias personalidades.

Não obstante, resta-nos um corpo de escrita e prática, o que torna possível avaliarmos o que Marx e Bakunin representaram.

Defenderei que um exame sério da questão gera os seguintes pontos:

  1. Bakunin distorceu e falsificou deliberadamente as opiniões de Marx sobre as questões em disputa.
  2. A acusação que levou à expulsão de Bakunin da Internacional, a de encabeçar uma sociedade secreta que tinha por objetivo infiltrar-se e assumir a Internacional, era verdadeira. (Já que isto parece ser aceito pela maioria dos historiadores, este ponto não será abordado. Conferir, p. ex., Anarchism de Woodcock, p. 168, ou o artigo de Aileen Kelly na edição de 22 de janeiro de 1976 do New York Review of Books). O único ponto digno de nota aqui é que as estruturas federais “autoritárias” da Internacional, contra as quais Bakunin protestou veementemente em 1871 e 1872, foram introduzidas na Internacional pouco antes, não sob a iniciativa do Conselho Geral do qual Marx era membro, mas pela moção dos apoiadores de Bakunin com o apoio e a participação ativa de Bakunin. Foi apenas depois que ele fracassou em obter controle sobre as estruturas da Internacional que Bakunin repentinamente descobriu o seu “autoritarismo”.
  3. A acusação de autoritarismo e de possuir concepções ditatoriais podem ser dirigidas contra Bakunin com muito mais justificativa do que contra Marx.

As deturpações deliberadas de Bakunin das concepções de Marx sobre o Estado foram observadas anteriormente. Bakunin estava obcecado com a ideia de que todos os alemães tinham opiniões autoritárias idênticas e atribuía constantemente os pontos de vista de alguns dos mais ferrenhos inimigos de Marx, como Bismarck e Lassale, a Marx. A fúria de Marx contra essa tática é uma questão de registro. Bakunin, em muitas das suas polêmicas contra Marx, argumenta partindo da premissa de que Marx deve obviamente ser autoritário, pois ele é alemão e judeu, que são por definição autoritários e estatistas. (Por conta da edição seletiva, isto não é evidente na antologia de Bakunin organizada por Dolgoff). Bakunin foi ainda mais longe, alegando que Marx era parte de uma conspiração internacional envolvendo Bismarck e Rothschild. Tais acusações não são obviamente dignas de resposta, mas elas certamente deixam claro que é necessário tratar os “fatos” e argumentos do homem com a maior prudência possível.

Um semelhante desprezo pelas regras de evidência mais elementares, para não mencionar a decência, permeou a maioria das polêmicas de Bakunin contra Marx. Ele acusou Marx repetidamente de defender uma ditadura universal, afirmando que ele acreditava num socialismo “decretado de cima para baixo”. Ele ignorou a insistência de Marx por toda a sua vida de que “a emancipação da classe operária só pode ser obra da própria classe operária” e sua oposição intransigente ao Estado. Ele igualmente não tentou dar suporte às suas acusações com fatos ou citações. Ao ler a caricatura de Bakunin das concepções de Marx – a única “versão” do marxismo que a maioria dos anarquistas se incomodou alguma vez em familiarizar-se! –, os leitores procurarão em vão por uma única citação em meio à confusão histérica de acusações loucas e infundadas. Simplesmente não há nenhuma.

Quase tão mal quanto são aqueles anarquistas que atacam Marx por sua “defesa” do “centralismo democrático” e do “partido de vanguarda”. Será realmente necessário salientar que estes conceitos foram desenvolvidos muito tempo após a morte de Marx, que Marx jamais pertenceu a uma organização que praticasse algum deles; que ele opunha-se sistematicamente às pequenas seitas conspiratórias de seu tempo; que ele fez a condição de seu ingresso na Liga dos Comunistas que eles se livrassem das suas formas organizacionais fechadas e antidemocráticas; que ele sempre recusou, com irritação, as tentativas dos socialistas de sua época de distingui-lo com honras ou títulos no movimento?

E terá sido completamente esquecido que um dos temas principais de Marx na sua crítica à Bakunin era o fascínio eterno deste último por políticas conspiratórias, sectárias e manipulatórias?

Pois existe, infelizmente para aqueles que acreditam em contos de fadas anarquistas, uma grande quantidade de evidências para alegar que Bakunin possuía precisamente aquelas visões “autoritárias” que ele descaradamente atribuía a Marx. Para aqueles que buscam evidência de uma propensão para políticas maquiavélicas e ditatoriais, acharão uma boa quantidade de material nos escritos não de Marx, mas de Bakunin. (Isto não quer dizer que Bakunin sempre manteve tais pontos de vista; há sérias contradições em seu pensamento que correspondem a uma polaridade básica).

A defesa de Bakunin de um Estado pós-revolucionário, que continuaria a maior parte das formas do Estado pré-revolucionário, tais como eleições, parlamento, exército etc., foi mencionada anteriormente e pode ser encontrada, por exemplo, em Bakunin on Anarchy, p. 153. De forma semelhante, a despeito da sua tão apregoada oposição a toda forma de ação política independente da classe trabalhadora, pode-se encontrá-lo defendendo, em suas cartas, não simplesmente a ação política, mas o apoio e a ação da classe trabalhadora a favor de partidos políticos burgueses. (Cf, p. ex., Bakunin on Anarchy, p. 219). E em outros lugares, pode-se encontrá-lo defendendo que os anarquistas deveriam candidatar-se ao parlamento (Bakunin on Anarchy, p. 218).

Não se tratam de meros produtos da sua ingenuidade dos dias de juventude, que são com tanta frequência usados para justificar algumas das suas mais grosseiras aberrações, como, por exemplo, quando encontramos o “jovem” Bakunin (então com 35 anos de idade) a escrever apelos ao czar, enquanto Marx, quatro anos mais jovem, está defendendo a derrubada revolucionária do Estado. Não, tais declarações, e muitas outras semelhantes, foram emitidas em privado precisamente na época em que Bakunin estava proclamando publicamente sua oposição ao marxismo por defender a ação política da classe operária e a ditadura de transição do proletariado no período pós-revolucionário imediato.

Também é importante contrastar a proclamação de Bakunin do princípio, para a futura sociedade anarquista, do “de cada qual segundo suas capacidades, a cada qual segundo seu trabalho” (minha ênfase) com o de Marx, que continha um princípio muito mais radical, “de cada qual segundo sua capacidade, a cada qual segundo suas necessidades”.

Ou considerar o regulamento de Bakunin para sua Aliança Internacional não um capricho passageiro, mas a organização a qual ele demonstrava sua lealdade preferencial enquanto participava na I Internacional. Eis aqui uma amostra, escrita em 1869: “É necessário que, em meio à anarquia popular, que irá constituir a própria vida e toda a energia da revolução, a unidade do pensamento e ação revolucionárias seja incorporada a um determinado organismo. Este organismo deve ser a associação secreta mundial dos irmãos internacionais…”

“… A única coisa que uma sociedade secreta bem organizada pode fazer é auxiliar no nascimento da revolução através da difusão, entre as massas, de ideias que estejam de acordo com o seu instinto, e organizar, não o exército da revolução – o exército deve sempre ser o povo –, mas um Estado-Maior revolucionário composto de indivíduos devotos, enérgicos e inteligentes que sejam acima de tudo sinceros – e não vaidosos ou ambiciosos – amigos do povo, capazes de servir como intermediários entre as ideias revolucionárias e os instintos populares.”

“O número destes indivíduos não deve, portanto, ser muito grande. Para a organização internacional em toda a Europa, cem revolucionários sérios e firmemente unidos seriam suficientes. Duas ou três centenas de revolucionários seria o bastante para a organização do maior dos países.”

Como disse o autoritário Marx acerca desta ideia libertária: “Dizer que os cem irmãos internacionais devem ‘servir como intermediários entre as ideias revolucionárias e os instintos populares’ é criar um abismo intransponível entre a ideia revolucionária da Aliança e as massas proletárias; significa proclamar que estes cem guardiões não podem ser recrutados em lugar nenhum a não ser entre as classes privilegiadas.”

Quando se compara as visões de Bakunin e Marx lado a lado, fica difícil lembrar que é supostamente Marx, e não Bakunin, o pai do “marxismo-leninismo”, e que é Bakunin, e não Marx, o suposto o pai do “anarquismo”.

As tendências autoritárias de Bakunin estavam em seu auge precisamente na época em que ele dividia a Internacional. Essa foi a época de sua associação com o notório Netchaiev. A maioria das fontes anarquistas tratam isto como uma aberração passageira da parte de Bakunin, e ele de fato repudiou Netchaiev quando descobriu sobre a verdadeira natureza de suas atividades.

Mas o fato é que Bakunin entrou em parceria com Netchaiev e sob a sua influência escreveu um número de panfletos que exibiam uma abordagem despótica e maquiavélica da revolução que superava de longe qualquer coisa que ele jamais houvesse acusado Marx. A autoria de algumas das obras em questão tem sido objeto de disputa, mas o ponto relevante é que Bakunin permitiu que esses panfletos fossem publicados carregando o seu nome e trabalhou ativamente para distribuí-los sabendo que eles levavam o seu nome.

Nesses panfletos, Netchaiev e Bakunin defendiam uma nova ordem social, a ser erigida “através da concentração de todos os meios da existência social nas mãos do Nosso Comitê e da proclamação do trabalho físico compulsório para todos”, residência compulsória em dormitórios comunais, regras para períodos de trabalho, alimentação dos fillhos, entre outras coisas. Nas palavras do “autoritário” Marx: “Que belo modelo de comunismo de caserna! Aqui você tem tudo: refeição comunal, sono comunal, assessores e escritórios regulando a educação, a produção, o consumo, em uma palavra, toda a atividade social, e para coroar, o Nosso Comitê, anônimo e desconhecido de todos, como o supremo-ditador. Isto de fato é o mais puro anti-autoritarismo…”.

Quando se observa as concepções de Bakunin acerca da autoridade e da revolução de forma detalhada, fica difícil discordar da afirmação de Marx e Engels de que Bakunin e seus seguidores simplesmente usavam a palavra “autoritário” pra designar algo que eles não gostavam. O rótulo “autoritário” era então, e permanece ainda hoje para muitos libertários, uma maneira de evitar questões políticas sérias.

O fato é que nem toda autoridade é má; em certas situações, a autoridade é necessária e inevitável. Como disse Engels, “Uma revolução é certamente o que há de mais autoritário; é o ato pelo qual uma parte da população impõe sua vontade sobre a outra por meio de fuzis,  baionetas e canhões – meios autoritários, se é que tais existem”.

E alguma forma de autoridade, isto é, de estrutura decisória, é necessária em qualquer forma de interação, cooperação ou organização que seja social em vez de individual. Numa sociedade socialista, ainda será necessário tomar decisões sobre as coisas; essas decisões irão necessariamente refletir a vontade, isto é, a autoridade da maioria. Isso não é uma violação da coletividade, mas um componente absolutamente indispensável desta. Dizer, como fazem muitos anarquistas, que eles rejeitam todas as formas de autoridade – mesmo aquela que é voluntariamente aceita, e que é o resultado da tomada democrática de decisões – é simplesmente defender seja o domínio por uma minoria, seja um retorno à forma mais pura de capitalismo de livre-mercado, tal como é defendido pela direita “libertária”. Nenhuma quantidade de conversa sobre “consenso” ou autonomia local ou iniciativa individual irá alterar este fato. O consenso nem sempre é alcançável, pois às vezes as pessoas não concordam. Então um processo de tomada decisório é necessário, e se ele é democrático, a minoria terá de aderir à maioria. A autonomia e a iniciativa individual podem ainda ter o maior papel possível, mas isso não altera o fato de que a autoridade da maioria prevaleceu na questão daquele momento.

Há outro aspecto de Bakunin que deve ser confrontado porque, assim como suas concepções mal definidas sobre a autoridade, este continuou a ser parte do movimento anarquista. Percorrendo todo o pensamento de Bakunin, e do pensamento e prática anarquistas subsequentes, há um lado obscuro, a saber, um fascínio pela violência, da destruição pela destruição, da ação pela ação, da desconfiança em relação à lógica, ao intelecto e ao conhecimento e um amor por organizações conspiratórias, rigidamente controladas. Na maioria das vezes, estas coisas permaneceram complementares aos seus – e de seus sucessores – instintos genuinamente libertários e humanistas.

Durante o período da associação de Bakunin com Netchaiev, o qual sentia-se atraído tão-somente pelo lado obscuro de Bakunin, este aspecto começou a tomar controle. Confrontado então com a realização deste lado obscuro na prática, na figura de Netchaiev, Bakunin retraiu-se em verdadeiro horror. Entretanto, como observa Aileen Kelly, “mesmo assim, ele conseguiu integrar a vilania de Netchaiev em suas próprias fantasias, escrevendo aos seus amigos espantados que os métodos de Netchaiev eram de uma natureza ‘pura’ e ‘santa’, o qual, confrontado com a apatia das massas e dos intelectuais na Rússia, não viu outro caminho senão a coerção para moldar os últimos em uma força determinada a mobilizar as massas para a revolução. Tal raciocínio, conclui Bakunin, “contém, lamentavelmente!, muita verdade”. 

Kelly prossegue: “Essa grotesca apreciação de Netchaiev é muito reveladora. Numa época em que a distância entre a natureza empírica e ideal do homem parecia enorme, Bakunin, embora relutante, concluiu que se os homens não desejam libertar-se a si mesmos, poderá ser necessário, para aqueles com os mais elevados interesses no coração, libertá-los contra a sua vontade”.

Para o mérito de Bakunin, ele lutou continuamente contra as implicações deste aspecto do seu pensamento. Sempre fascinado por todos os atalhos “revolucionários”, ele não obstante se esforçou para permanecer igualmente leal aos seus instintos libertários, e é este aspecto da sua visão notavelmente polarizada que ele deixou como herança duradoura. O movimento anarquista que ele gerou foi também atormentado com a mesma polaridade pela tensão entre “libertarismo” verdadeiro de um lado; e a atração, por vezes irresistível, pelo anti-intelectualismo, terrorismo e conspiração, por outro. O movimento anarquista precisa encarar de frente a herança ambígua de Bakunin. E para fazê-lo, precisa também fazer as pazes com Marx.

Publicado em The Red Menace, Vol. 2, No. 2, Primavera de 1978, acompanhado do artigo Anarquismo v. Marxismo.


[1] The Red Menace. P.O. Box 171, Station D, Toronto, Ontario, Canada.

[2] Alguns termos utilizados pelo autor do texto são reificados e podem confundir o leitor em relação ao pensamento de Marx. Nesta frase, por exemplo, ele utiliza as palavras “previsões [predictions]”, “observações empíricas [empirical observations]” e “abstração científica [scientific abstraction]” reiterando, em seguida, a palavra “observação”. O mais correto seria falar em “tendências”, “realidade concreta” e “processo de abstração”, caso contrário a linguagem remete ao positivismo, o que nada tem a ver com Marx. Para entender o porquê dessas pontuações, sugiro a leitura da Contribuição para a crítica da economia política, de Marx, especialmente o capítulo sobre o método da economia política. [Nota da revisora].

[3] “Leis” no sentido de “tendências”. [Nota da revisora].

[4] Por outro lado, eu não vejo todos os “marxistas-leninistas” como contrarrevolucionários, como vários anarquistas parecem fazer. Vários (particularmente trotskistas) são revolucionários sinceros que não entendem as implicações da ideologia que eles aderem. O fato de que o “marxismo-leninismo” é uma ideologia contrarrevolucionária não significa dizer que todo “marxista-leninista” é um contrarrevolucionário, assim como o cristianismo é reacionário, o que não torna todo indivíduo cristão um reacionário. Nem as diferenças políticas que dividem a esquerda são sempre tão absolutas como elas são feitas para ser. Há sempre, necessariamente, áreas cinzas, onde, por exemplo, anarquismo e marxismo começam a convergir, ou marxismo e leninismo, ou – sim – anarquismo e leninismo. A vida nem sempre se analisa pelas categorias “eles” e “nós”, pela razão de que todos nós internalizamos ao menos alguma bagagem repressiva da sociedade dominante. Todos temos algo de “contrarrevolucionário” em nós mesmos.

[5] Por exemplo, Mark Brothers em seu artigo Anarchy is liberty, not disorder, na edição 4 do The Open Road, usa os termos “marxismo” e “maxismo-leninismo” indistintamente, e não sabe, ou acha que não vale a pena mencionar, que dois de três conceitos que ele critica – a vanguarda partidária e o centralismo democrático – estão longe de ser encontrados em Marx, enquanto o terceiro, ditadura do proletariado, possui significados diferentes em Marx e nos leninistas. Similarmente, Murtaugh (The End of Dialectical Materialism: An Anarchist Reply to the Libertarian Marxists) sabe tão pouco sobre marxismo que ele nem sequer sabe que nem Marx nem Engels nunca usaram o termo “materialismo dialético”, que ele levianamente supõe que os “marxistas libertários” aderem, e que ele dispõe em quatro páginas. (O [termo] materialismo dialético apareceu pela primeira vez oito anos depois da morte de Marx, cortesia de Plekhanov).

[6] Importante notar que tanto Pannekoek como Korsch também eram comunistas de conselho. [Nota da revisora].

A tradução de todos os textos foi realizada por Alexandre Guerra. A revisão ficou por conta de Aline Ferreira. A introdução do coletivo Root & Branch foi traduzida de acordo com a versão disponível em: https://libcom.org/library/root-branch-7#2. O ensaio “Anarquismo vs. Marxismo: Algumas notas sobre um antigo tema” foi traduzido a partir da versão disponível em: https://libcom.org/library/anarchism-vs-marxism-few-notes-old-theme. Por fim, o ensaio “Bakunin vs. Marx” foi traduzido segundo a versão disponível em: https://libcom.org/library/bakunin-vs-marx.

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