[Nota do Crítica Desapiedada]: A organização Liga Comunista Spartacus [Communistenbond Spartacus] é totalmente desconhecida do público brasileiro. No livro de Bourrinet, The Dutch and German Communist Left (1900–68), o autor dedica uma seção (The Communistenbond Spartacus and the Council-Communist Current (1942–68) para discutir detalhes historiográficos que elucidam as origens, as atividades, a organização, os membros, entre diversos outros elementos daquela organização. No futuro, pretendemos traduzir e disponibilizar a discussão de Bourrinet para o leitor. Por agora, o que oferecemos ao leitor é uma breve síntese fornecida pelo Arquivos Pannekoek, que já traz uma pequena contextualização histórica sobre a existência do grupo.
Communistenbond “Spartacus” (1943-1981) – Introdução
Após a greve de fevereiro de 1942 em Amsterdã, na qual participaram tanto a Frente Marx-Lenin-Luxemburgo como membros do GIC, quase todos os membros da Centrale leiding (Direção Central) da m.l.l.-Front foram presos e executados em março, e a Frente desapareceu. No verão de 1943, Stan Poppe, em Roterdã, acompanhado por Jan Naaraat, Leen Molenaar, Jaap van Otterloo e Toon van den Berg, e em Amsterdã por Bertus Nansink, Wiebe van der Wal e outros, refundou uma primeira organização chamada Revolutionair-Socialistische Arbeidersbeweging, logo chamada de Communistenbond “Spartacus”. Esta organização possuía posições internacionalistas confusas, e se opôs ao igualmente recém-fundado Comitê van Revolutionaire Marxisten, que defendia (em sua versão mais extensa) uma “defesa revolucionária do Estado Operário degenerado e dos camponeses” (o Sovjet-Union) e, portanto, contra as opiniões de Leon Trotsky e Henk Sneevliet, ou seja, definitivamente contra o campo Aliado.
Stan Poppe e seus camaradas tornaram-se influenciados pelas posições de Herman Gorter. Eles tenderam ao comunismo de conselhos enquanto tentavam permanecer em continuidade com o passado organizacional, bem como aos esforços fracassados para se unirem a outros grupos.
A partir da segunda metade de 1943, os ex-membros do GIC estiveram em contato com o Spartacus. No verão de 1944, após longos debates, e reconhecendo a sua própria fraqueza teórica, o Comunistenbond finalmente convidou os membros do GIC para trabalhar com eles; o GIC aceitou contribuir por escrito e por discussão, mas sem aderir imediatamente à organização, desconfiando dos antecedentes “leninistas” do Spartacus; após algum esclarecimento, o GIC aderiu no início de 1945, mas logo depois saiu em 1947.
Obs.: O texto pode ser lido em pdf: Tarefas e Características do Novo Partido.
Introdução
Esta reedição do “Tarefas e Características do Novo Partido” faz com que um dos textos mais importantes da esquerda holandesa esteja novamente disponível após 77 anos. As teses sobre o futuro partido foram adotadas na Conferência de dezembro de 1945 da Liga Comunista “Spartacus”, que havia acabado de sair da ilegalidade. O “Spartacus” surgiu no meio do inferno da Segunda Guerra Mundial da fusão de duas organizações que haviam permanecido fiéis ao internacionalismo proletário, a ala revolucionária da Frente Marx-Lenin-Luxemburgo e parte dos membros do Grupo de Comunistas Internacionalistas (GIC)[1]. As duas organizações tinham histórias diferentes, às vezes posições completamente diferentes, mas tinham uma origem comum na luta contra a participação da social-democracia na Primeira Guerra Mundial. O GIC e a MLL-Front se encontraram no princípio de que o proletariado não tem que tomar partido na guerra imperialista, mas que se opõe à guerra entre nações com a revolução proletária. No caso da Segunda Guerra Mundial, isto significava que a resistência dos trabalhadores tinha que ser feita não somente contra o campo fascista, mas também contra os campos democráticos e “soviéticos” e a frente de resistência antifascista associada. A única maneira de deter a carnificina imperialista na Segunda Guerra Mundial foi, como na Primeira Guerra Mundial (como agora para evitar uma Terceira Guerra Mundial), intensificar a luta dos trabalhadores internacionais contra as raízes da guerra imperialista: o modo de produção capitalista.
Não é coincidência que este texto seja agora altamente atual, enquanto que, nos anos 60, foi rejeitado como obsoleto tanto pelo Spartacusbond quanto pelo grupo Daad en Gedachte que dele emergiu. Cajo Brendel, membro do Daad en Gedachte, em seu “Anton Pannekoek, theorikus van het socialisme” (Nijmegen, 1970) qualifica “Tarefas e Características do Novo Partido – Liga Comunista “Spartacus” como uma expressão da visão média do “Spartacusbond” naquela época, como um “compromisso” entre as visões do conselho comunista, RSAP e até mesmo OSP” (nota 229)[2].
É verdade que “Tarefa e Características” se propõe a formar um partido, algo que o GIC rejeitou nos anos 30. Mas em “Tarefa e Características”, não há posições programáticas que diferenciem o RSAP e o OSP do GIC. Os ex-membros do GIC escreveram o texto. Os membros da MLL-Front ficaram atônitos ao encontrar nesse texto uma “posição partidária” que eles acreditavam ter renunciado sob a influência dos mesmos ex-membros do GIC[3]. A rejeição do partido pelo GIC nos anos 30 não foi idêntica à posição antipartidária de princípio de Otto Rühle e da AAU-E, da qual Cajo Brendel era um apoiador. Nos anos 30, a KAPD havia se encolhido em uma seita que se mostrou incapaz de aprender as lições de sua própria história e da relacionada “Arbeiterunionen” (AAUD-“Berlin”, AAUD-“Essen” e AAU-Einheitsorganisation). No entanto, a “Unionen” foi capaz de fazer isso. Portanto, em certo sentido, a “Union” [União] assumiu o papel do partido como a organização comunista dos elementos mais conscientes e militantes[4]. Após a tomada de poder nacional-socialista na Alemanha, o GIC esperava uma Segunda Guerra Mundial e, ao final dela, uma repetição dos movimentos insurgentes de 1917-1923. Portanto, era natural que os ex-membros do GIC preparassem a formação de um novo partido, semelhante ao KAPD, mas com a mudança de visão até então.
As expectativas de ondas de greves de massa e tentativas de revolução proletária desde 1945, especialmente na Alemanha, não se materializaram. A Liga Comunista “Spartacus” se reduziu a um pequeno grupo sem influência na classe trabalhadora. O texto “Tarefas e Características” foi logo posto em questão internamente, e pode-se duvidar com razão se este texto funcionou como a base programática e organizacional da Liga.
O texto também contém deficiências significativas em sua análise da derrota do movimento do conselho após a Primeira Guerra Mundial.
Dentro da Alemanha, a revolução careceu da unificação das lutas proletárias em várias regiões da Alemanha de Weimar sob a pressão dos pagamentos compensatórios impostos à burguesia “perdedora”.
Dentro da Europa, a classe trabalhadora estava dividida entre os países que haviam ganho a guerra (França e Grã-Bretanha) e os países que haviam perdido a guerra (Rússia, Alemanha, Áustria, Hungria e Itália). Enquanto os países perdedores mostraram o início de uma revolução mundial, os países vitoriosos não experimentaram nenhuma luta significativa dos trabalhadores. Foi somente na Depressão dos anos 30 que os trabalhadores da França e da Grã-Bretanha começaram a se mover. Seu movimento foi rapidamente desviado para o terreno burguês das Frentes Populares e do Antifascismo em preparação imediata para a Segunda Guerra Mundial, a mais trágica das quais foi a “Guerra Civil” espanhola. A crise econômica só se fez sentir nos países vitoriosos quando terminou o período de reconstrução, e os trabalhadores revolucionários na Alemanha, Itália e Rússia já estavam em campos de concentração ou massacrados aos milhares. Na Segunda Guerra Mundial, a burguesia internacional impediu uma nova Revolução “alemã”, bombardeando bairros operários, ocupação militar posterior e fome[5], seguida pela ajuda de Marshall, da política keynesiana e do “welfare” state.
Na Rússia, o “Estado Operário e Camponês” (Lenin) foi liderado pelo mesmo Partido Comunista que havia sido anteriormente a vanguarda do proletariado mundial na resistência à guerra imperialista e na revolução. Este Estado utilizava os sindicatos para assumir o poder político sobre a sociedade a partir dos conselhos operários. A traição de classe do Partido Comunista Russo, e na esteira de todos os partidos filiados à Terceira Internacional, levou o comunismo de conselhos a negar o caráter originalmente proletário dos partidos comunistas “oficiais”. Portanto, o fracasso da revolução proletária na Rússia poderia ser apresentado como uma vitória, considerando-a como uma revolução burguesa em um país atrasado. Assim, a análise inicial da Revolução “russa” como o primeiro passo para a revolução mundial foi posta de lado.
“Tarefa e Características” não se sai melhor ao juntar os partidos estalinistas e social-democratas com grupos revolucionários, chamando-os de todas as correntes do movimento operário. Além disso, oferece uma explicação adicional para o fracasso de todos os movimentos revolucionários proletários até aquele momento: o capitalismo ainda não havia introduzido uma administração baseada no horário de trabalho (ou seja, o sistema taylorista) na (maioria) das empresas (tese 29). Este ponto é um importante acréscimo ao trabalho do GIC sobre os problemas econômicos após a revolução.[6] Mas, no contexto de um texto sobre o partido, é um equívoco teórico que obstrui a visão das tarefas políticas da revolução e das condições em que ela se desenvolve. A Primeira e a Segunda Guerras Mundiais indicavam que o capitalismo imperialista mundial precisava muito de uma revolução. Mas durante e após a Segunda Guerra Mundial, o proletariado estava ainda mais carente de consciência e organização do que na Primeira Guerra. A eclosão das guerras foi em si mesma uma terrível derrota da qual a classe trabalhadora teve dificuldade de se recuperar. As condições do pós-guerra também impediram o proletariado de desenvolver suas forças de classe.
Este período agora está muito distante de nós. Enquanto a guerra na Ucrânia se prepara para uma Terceira Guerra Mundial entre os EUA e a China, graves crises econômicas atingem todos os países. Com sua crescente exploração e opressão, com seu sangue, a classe trabalhadora está pagando pelas consequências desta crise, das guerras interimperialistas e da destruição da natureza. O desenvolvimento da consciência e da luta do proletariado mundial fica atrás da aceleração do curso desastroso do capitalismo. Mas não pode ser de outra forma para a classe oprimida e explorada que é o proletariado. A mesma realidade de guerras, crises e desastres pode produzir lutas de trabalhadores de massa e grupos revolucionários. Como expressão e maior desenvolvimento da consciência dos trabalhadores, estes grupos terão que formar um novo partido mundial para que a luta dos trabalhadores possa se tornar uma força internacional, derrubar os Estados, abolir o trabalho assalariado e, assim, eliminar o capital.
Fredo Corvo, Amsterdã 2022
[1] O GIC havia se dissolvido quando os alemães invadiram o país em 1940. A razão para esta liquidação foi provavelmente a suspeita de que o grupo continha um ou mais informantes da polícia; informações internas eram divulgadas regularmente sem que fosse possível estabelecer quem era responsável por isto (comunicação de Lea Appel; FC).
[2] A OSP e posteriormente a RSAP permaneceram partidos social-democratas oposicionistas na Holanda do período entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. O RSAP se dissolveu em 1940 e seus membros mais confiáveis formaram a frente clandestina MLL-Front.
[3] Comunicação de Bertus Nansink; FC.
[4] Ver H. Canne Meijer “Die Arbeiterrätebewegung in Deutschland (1918-1933)”. Junto com Jan Appel, Canne Meijer esteve intimamente envolvida em extrair estas lições e na subsequente unificação dos remanescentes do movimento dos conselhos no KAUD.
[5] K.H. Roth “Die ‘andere’ Arbeiterbewegung”, Munchen 1976.
[6] GIC “Princípios fundamentais da produção e distribuição comunista”.
Tarefas e Características do Novo Partido[1]
Uma Análise de Movimentos de Massa
Uma Crítica da Antiga Visão do Partido
Esboço do Desenvolvimento do Capitalismo
A Tarefa dos Trabalhadores Revolucionários Agora
Teses adotadas na Conferência da Liga Comunista “Spartacus”, realizada em dezembro de 1945.
Liga Comunista “Spartacus”
Prefácio à primeira edição (1945)
Nós sentimos a necessidade [de um texto] no qual os objetivos da Liga Comunista “Spartacus” fossem apresentados às pessoas interessadas de uma maneira mais apropriada do que é possível em uma publicação periódica. A Liga decidiu trabalhar nesta direção. É a partir desta consideração que este documento aparece, contendo nossas visões sobre a tarefa e a essência do novo partido.
Onde este documento é construído a partir de teses, o argumento é sem dúvida bastante comprimido. Além disso, tantas experiências novas são [lições] obtidas na luta cotidiana do trabalho que é desejável elaborar muitos pontos em outros textos. Ao fazê-lo, será feita uma tentativa de se ligar fortemente à prática da luta. No entanto, esta publicação fornece uma base excelente para este trabalho futuro. Por este motivo, esperamos que uma grande demanda tornará fácil para nós executar planos adicionais sistemática e prontamente.
A Liga Comunista “Spartacus”
Tarefas e Características do Novo Partido
A mudança estrutural do capitalismo exige uma análise do papel e da natureza do partido
1. A crítica atual dos velhos partidos não é apenas uma crítica de sua política prática ou do comportamento dos líderes, mas uma crítica da velha concepção do partido como um todo. É uma consequência direta das mudanças na estrutura e nos objetivos do movimento de massa. Afinal, a tarefa do partido (revolucionário) está em sua atividade no movimento de massa do proletariado.
2. A crítica negativa da velha concepção do partido, bem como a formulação positiva de uma nova, deve, portanto, se basear em uma análise do movimento de massa, das causas de sua derrota temporária, bem como das condições de sua revitalização em novas formas. Uma análise assim é ainda mais necessária já que, segundo as antigas e herdadas visões, as condições para o desenvolvimento do movimento de massa tinham que ser mais favoráveis agora do que nunca antes. Além da miséria causada pela Segunda Guerra Mundial, que é muito mais profunda e maior do que aquela após a Primeira, há a ameaça imediata de uma Terceira e ainda mais destrutiva guerra; além disso, a consciência dos trabalhadores mal foi domada pela Liga das Nações e por ilusões similares. A necessidade de libertar a classe trabalhadora dos vínculos com o capitalismo é, portanto, mais convincente do que nunca, ao passo que, por outro lado, várias ações de greve já demonstraram que o aparato de opressão, em particular o exército, não é totalmente confiável para a burguesia. Também não se pode explicar a falta de movimentos de massa revolucionários pela política errônea dos assim chamados líderes operários, uma vez que os trabalhadores mal lhes dão ouvidos quando começam a se movimentar. Também não se pode explicar a ausência destes movimentos por uma “apatia” geral da classe. As causas são muito mais profundas e só podem ser compreendidas através da análise social. Elas se encontram na situação social alterada, como um resultado da qual um movimento de massa dos trabalhadores nas formas antigas e com os antigos objetivos se tornou insignificante. Nossa crítica das velhas visões do partido e nossas tentativas de chegar a uma nova visão, que deve se basear em um exame do desenvolvimento do movimento de massa, deve, portanto, começar com uma análise social geral.
3. No entanto, uma análise assim não deve só cobrir o período atual, mas, se ela pretende conduzir a uma compreensão real da falência (em um sentido revolucionário) do antigo movimento operário, deve incluir também o período de crescimento e desenvolvimento deste movimento. Ela deve, portanto, ser uma análise do desenvolvimento social durante toda a evolução do capitalismo.
O surgimento do capitalismo, a revolução burguesa e o primeiro movimento operário
4. Sobretudo nos séculos XVI e XVII, a acumulação original[2] do capital mercantil ocorreu na pirataria organizada e na pilhagem de regiões ultramares. Este capital, assim concentrado nas mãos de comerciantes ricos e instituições bancárias, acabou entrando nas diversas empresas manufatureiras criadas durante este período. Neste estágio, o capital precisava principalmente do forte poder estatal para proteger o desenvolvimento do comércio interno e exterior e para garantir o crescimento da manufatura. A jovem burguesia, portanto, buscou ajuda do monarca, que frequentemente se tornava ele mesmo o maior empreendedor capitalista do país. Este foi o período de Elizabete (Inglaterra), Colbert (França) e do “despotismo iluminado” (Alemanha, Áustria). Apenas na Holanda, onde nessa época a luta entre o capitalismo e o sistema feudal já havia chegado a um fim, a organização do poder estatal pôde acontecer da forma tipicamente burguesa da república.
5. No entanto, o período de produção e comércio interno e exterior organizados e protegidos pelo Estado, necessários para prover o capital com a expansão e força necessárias na economia interna e externa, havia chegado ao fim depois que o capital havia superado sua fraqueza inicial. Isto foi principalmente quando a indústria baseada em máquinas começou a surgir. A necessidade de proteção deu lugar àquela de oportunidades descontroladas de competição e exploração. Agora a burguesia tem de esmagar os vestígios da antiga organização econômica feudal, as antigas restrições impostas pelas regulações de guilda, e as novas [restrições] do Estado mercantilista. Agora, ela está conquistando o poder estatal para estabelecer os “direitos humanos”, isto é, para libertar o capital de todos os laços político-econômicos. Foi nessa época que o partido político se desenvolveu como uma organização da ala radical da burguesia que, em sua luta contra os obstáculos ao desenvolvimento de seu sistema econômico, destruiu a antiga formação social e liberou amplas seções da população trabalhadora da servidão e da opressão. Este partido político é a organização com a qual a burguesia mobilizou as massas da população para estabelecer seu próprio regime. Este caráter exclusivamente político da revolução burguesa é típico, pois toda organização econômica está alheia ao capitalismo liberal agora em desenvolvimento. No campo econômico, o “laissez-faire, laissez aller” [deixai fazer, deixai ir] e os direitos irrestritos de exploração e de comércio se aplicam.
6. A revolução burguesa ocorreu com meios de luta puramente políticos. Suas armas eram a rebelião armada, a conquista do parlamento, a destruição física do inimigo de classe. Já na revolução burguesa, contudo, surgiram movimentos independentes do proletariado, os quais tinham um caráter inteiramente diferente (como a greve dos trabalhadores do setor têxtil em Lyon). Os trabalhadores não renunciaram a seus meios políticos de luta, mas os ligaram diretamente aos meios econômicos. Pois, ao passo que o capital deve lutar pela exploração ilimitada, o proletariado se opõe a esta mesma exploração. Na classe trabalhadora, portanto, nós encontramos desde o primeiro momento o envolvimento conjunto em ações econômicas, numa luta contra a exploração. Ao mesmo tempo, estão surgindo movimentos que estão lutando por uma nova organização econômica da sociedade, sem exploração, na qual os produtores querem controlar a produção e a distribuição em completa democracia e cooperação. A despeito de seu caráter meio utópico, estas tendências têm uma grande influência no pensamento e nas ações da classe trabalhadora nos dias de hoje.
7. Nós também encontramos um desejo pela organização econômica entre os pequenos artesãos que sobraram das Idades Médias. Em seu caso, entretanto, ele assume a forma de tentativas de criar uma sociedade de pequenos produtores independentes que queriam se proteger contra o desenvolvimento e a dominação de grandes negócios (Proudhon) usando certas regulações sociais gerais. Nas utopias socialistas daqueles dias, nós encontramos os dois elementos, tanto o proletário como o pequeno burguês, misturados. Isto é uma consequência natural da origem da classe trabalhadora de pequenos artesãos proletários.
8. Quando o capitalismo industrial se expandiu na primeira metade do século XIX, quando a exploração pela introdução da máquina de produção mecânica excedeu os limites do fisicamente possível, quando, por outro lado, a consciência de classe dos trabalhadores e sua resistência mental foram fortalecidas ao romper completamente todos os laços com o passado pequeno burguês, já que ele ainda existia no período da manufatura, a luta dos trabalhadores contra a exploração pelo capital começa a ocorrer. Esta luta tem como seu primeiro objetivo organizar os trabalhadores em seu próprio poder contra o capital. Neste período, os sindicatos surgiram como organizações de poder e batalha econômicos. Também, os trabalhadores tentaram se formar no poder político, se organizando como um movimento político para tentar conquistar uma representação parlamentar. Também, eles lutaram para aumentar a força física e moral da classe trabalhadora ao impor a legislação trabalhista. Os meios de ação dos trabalhadores são a rebelião armada e, diretamente relacionada a ela, a greve geral. Deste modo, o movimento operário de massa se desenvolve em sua tentativa de alcançar a primeira formação de poder, já diretamente numa feroz greve geral contra a classe dominante. (O movimento cartista na Inglaterra, os grandes movimentos de massa do proletariado na Europa continental antes e depois de 1848). Nas mentes dos trabalhadores, havia uma visão de que estes movimentos eram apenas os primeiros passos rumo à criação do poder, o objetivo adicional sendo a abolição geral da exploração, a destruição do capitalismo e a instauração do poder operário.
9. Por necessidade, estes movimentos de massa do proletariado se dirigiam principalmente contra a fortaleza do poder político da burguesia: contra o Estado. Alinhada com a prática destes movimentos de massa e também com a tradição da revolução burguesa, a ideia de que a conquista do poder estatal era o primeiro passo rumo à instauração de uma sociedade comunista se tornou firmemente estabelecido em suas mentes. Esta visão encontra sua formulação mais pura no Manifesto Comunista. Mesmo após 1848, esta tendência continuou a predominar no movimento de massa do proletariado e foi expressa no conceito teórico da Primeira Internacional.
10. Neste período de desenvolvimento da ação de massa, o partido político da classe trabalhadora começou a desempenhar um papel crescente. Uma vez que os trabalhadores ainda não haviam se tornado a maioria esmagadora da população, o partido político ainda aparecia como a organização necessária que servia para arrastar a maioria da população à ação dos trabalhadores da mesma maneira que o partido da burguesia havia feito na revolução burguesa. Logo, o partido aparecia como a representação política do poder da classe trabalhadora; ao se tornar o chefe de Estado, o proletariado conquistaria o poder do Estado. A visão de Marx de que a “libertação dos trabalhadores deve ser obra dos próprios trabalhadores” não contradiz de modo algum as concepções de lutas pelo poder e o eventual governo do partido proletário durante este período.
11. A derrota da Comuna de Paris em 1871 selou a derrota desta primeira fase no desenvolvimento do movimento de classe dos trabalhadores. O desenvolvimento na Alemanha levou ao crescimento de um novo capitalismo organizado nacionalmente, forte o bastante em suas possibilidades de desenvolvimento para salvar o capital francês da derrocada da revolução. Por outro lado, o movimento de classe do proletariado ainda estava fraco demais, muito misturado com as lutas pequeno burguesas, para constituir uma ameaça real ao capital. Na Comuna de Paris, se mostrou que o Estado, o aparato opressivo da classe dominante, o protetor das possibilidades de exploração da burguesia, não pode ser conquistado pelo proletariado. O Estado é hostil às aspirações revolucionárias dos trabalhadores não só em sua liderança, mas em todo seu ser. Pois a função do Estado é dominar e oprimir a população trabalhadora; esta função determina tanto a estrutura de seu aparato e as atitudes e comportamento de seus incontáveis servidores públicos. Os trabalhadores da Comuna de Paris foram, portanto, forçados a destruir este Estado burguês e a estabelecer sua própria organização de poder. No entanto, nesta primeira tentativa, com base no ainda fraco vínculo econômico e na ainda pouca força da classe trabalhadora, eles ainda não foram capazes de superar o capital definitivamente.
O capitalismo liberal. O reformismo. O Estado como cuidador da classe trabalhadora
12. A influência da derrota da Comuna de Paris no desenvolvimento do movimento operário caminha em duas direções. Primeiro, ela significa o fim provisório das tentativas de destruir o capitalismo por meios revolucionários. As tendências reformistas no movimento dos trabalhadores começaram a se desenvolver – fracamente, num primeiro momento, mas mais fortemente após 1900 conforme a organização do capital se tornava cada vez mais poderosa. O partido político cessou de ser uma formação de poder da classe trabalhadora; ele se tornou a representação diplomática dos trabalhadores na sociedade capitalista. Como uma oposição leal, ele participava do parlamento, participava da organização da sociedade capitalista. Os sindicatos se tornaram os representantes dos trabalhadores no campo econômico. Como a contrapartida necessária na regulação das condições de exploração, logo surgiram os sindicatos dos empregadores. Este novo desenvolvimento foi possibilitado pelo fato de que o capital havia deixado o período de exploração e competição desorganizadas para trás; foi precisamente a vitória do capital nacional alemão que acelerou este desenvolvimento. Os capitalistas individuais não eram mais fortes o bastante para manter sua competitividade; os primeiros passos para a organização do capital foram, portanto, dados através de acordos entre as várias empresas capitalistas. Então havia também a possibilidade de concluir tais acordos com os trabalhadores e os sindicatos eram os órgãos de mediação apropriados para este propósito. O partido operário atuava como o órgão político, representando os trabalhadores na regulação geral das condições de exploração na assim chamada legislação trabalhista. Este período se caracterizou assim pelo fato de se ter dado à classe trabalhadora um lugar reconhecido dentro do sistema capitalista, com direitos reconhecidos. Ao mesmo tempo, contudo, ele descartou sua oposição fundamental a este sistema, deixando como um “ideal socialista” a visão de que a classe trabalhadora, abrangendo a maioria absoluta da sociedade, finalmente conquistaria o Estado por meios democráticos para estabelecer o socialismo.
13. O partido social-democrata, que se desenvolve durante este período, adapta sua estrutura perfeitamente a sua atividade prática. Ele, também, assume a forma da falsa democracia burguesa, com o congresso do partido como parlamento e a administração cotidiana como ministros. Aqui, também, o poder real está com os conselhos de diretores que estão em contato diário com os representantes do Estado capitalista e que detêm todas as alavancas do poder do partido. Aqui, também, sob o pretexto da democracia completa, há na realidade uma separação completa entre as massas de membros e a liderança do partido, resultando na impotência total da filiação dos primeiros.
14. Além de e em contraste com esta prática reformista do movimento operário, a crítica fundamental deste desenvolvimento se desenvolveu em sua ala revolucionária. Além disso, a derrota da Comuna de Paris também significou o fim da primeira fase no desenvolvimento do movimento de massa do proletariado. Mas isto não significou que a luta revolucionária pertencia para sempre ao passado; pelo contrário, esta luta também tinha que ser travada em uma fase superior do desenvolvimento capitalista. Agora que o Estado havia se tornado cada vez mais o defensor e representante sem máscaras dos interesses do capital e que pela primeira vez (na Alemanha) ele havia agido externamente como uma organização direta do poder do capital e uma vez que os trabalhadores da Comuna já estavam na fase inicial da luta forçada para destruir esta organização estatal, a luta revolucionária dos trabalhadores atingira o ápice de seu desenvolvimento; ela não buscava mais a conquista, mas sim a destruição deste Estado burguês. A crítica das velhas ideias socialistas do Estado havia começado (Marx, Wilhelm Liebknecht) e foram desenvolvidas as primeiras ideias para a organização de uma sociedade comunista com a abolição do trabalho assalariado como um fundamento.
15. Ao passo que a prática do movimento operário caminhou inteiramente na direção reformista, o trabalho teórico da ala revolucionária nos anos 1871 a 1914 contribuiu muito para tornar possível a posterior crítica fundamental do antigo movimento operário. Contudo, as ideias dos revolucionários estavam afastadas demais da prática reformista para tomar controle sobre a grande massa de trabalhadores. Diante dos brilhantes sucessos da social-democracia, elas tinham pouca chance. Não eram apenas vitórias em eleições, mas também uma expansão sempre crescente da legislação trabalhista. A grande massa de trabalhadores não viu e não podia ver que esta melhora em sua posição só havia sido possível pelo boom em desenvolvimento do capitalismo e que ela teria que saltar tão inexoravelmente numa deterioração absoluta e acelerada quando o capitalismo chegasse ao fim de sua expansão produtiva. Consequentemente, a visão socialista de Estado de que o Estado fosse designado o zelador da classe trabalhadora tornou-se cada vez mais enraizada nos trabalhadores. Como resultado, a crítica fundamental dos revolucionários, para quem a aparente melhora na posição da classe trabalhadora era apenas a expressão de seu empobrecimento em relação ao poder do capital e do valor excedente que cresciam muito mais rapidamente, não podia ser aceita pelos trabalhadores.
16. A catástrofe de 1914 revelou o conflito que havia crescido durante décadas entre o movimento operário reformista e as tendências operárias anticapitalistas. O movimento operário reformista não era mais do que o representante dos interesses dos trabalhadores dentro do capitalismo; em sua prática, seu método, sua estrutura, seu objetivo, ele estava inteiramente vinculado ao capitalismo. Do mesmo modo que ele havia sido o representante leal dos trabalhadores na paz, ele continuou assim na guerra. Apenas naqueles países nos quais o capitalismo ainda não havia alcançado seu pleno desenvolvimento e o reformismo não havia, portanto, se tornado a prática dominante (Rússia, Itália) a social-democracia se voltou contra a guerra. Nos outros países, ela apoiou a burguesia nacional em sua guerra, retirando assim a única consequência possível de seu desenvolvimento no passado. Para os trabalhadores, contudo, isto significou que o antigo movimento operário não atuava mais como o defensor de seus interesses reais. A eclosão da guerra mundial significava que a fase de empobrecimento relativo havia sido sucedida pela fase de empobrecimento absoluto. Este novo desenvolvimento tinha que trazer os trabalhadores de volta à resistência revolucionária contra o capital. Como resultado, os trabalhadores também entraram em conflito com a social-democracia.
O período do Estado socialista revolucionário do movimento operário
17. Na luta revolucionária que irrompeu como resultado da guerra mundial, as organizações de empresa[3] e os conselhos operários surgiram espontaneamente como um órgão da democracia operária dentro de empresas e da democracia política local. Nas mentes dos trabalhadores, no entanto, ainda existia a visão de que o Estado era o meio indispensável para a organização da economia como um todo. Esta visão era o produto de todo o período da luta de classes precedente, de uma prática durante a Primeira bem como durante a Segunda Internacional. Também não havia nada na sociedade capitalista que pudesse afastar esta ideia das mentes dos trabalhadores. O capitalismo ainda não havia chegado a sua própria organização da produção em larga escala; a contradição com a organização pelos próprios produtores ainda não havia se tornado uma prática tangível. Além disso, os conselhos operários e as organizações de empresa não encontraram um ponto de partida único para tal organização. Assim, não podia ser diferente, ou o poder tinha de voltar para um partido quase socialista, que tinha de tentar organizar a produção em nome dos trabalhadores. A transferência do poder real à organização estatal, que foi simplesmente tomada do antigo Estado burguês, significava, no entanto, a continuidade do sistema de exploração capitalista. E o novo governo quase socialista não tinha escolha senão se adaptar às demandas deste sistema. Ele não podia nem sequer implantar a nacionalização e a economia planificada desejada pelos trabalhadores até que a necessidade por ela tivesse crescido através do desenvolvimento do próprio capitalismo.
18. A visão socialista de Estado ganhou nova autoridade como um resultado do desenvolvimento na Rússia. Na Rússia, a burguesia nacional era fraca e não havia classe de artesãos. Sob estas circunstâncias, o capitalismo privado não podia se desenvolver aqui e, sob a pressão de intervenção estrangeira e a necessidade de dominar a desorganização doméstica, um sistema de dominação estatal, concebido por muitos como socialismo ou pelo menos como um primeiro passo no desenvolvimento rumo ao socialismo, se desenvolveu como um resultado da luta revolucionária dos camponeses e dos trabalhadores. A Revolução Russa deu uma aura revolucionária à visão socialista de Estado e isto contribuiu bastante para obstruir a real consciência revolucionária dos trabalhadores.
As três principais tendências no movimento operário
19. Desta maneira, a ação de massa dos trabalhadores cai em três tendências principais. A primeira, a tendência reformista, que se pensava ter dado o passo decisivo rumo ao socialismo ao conceder poder ao partido social-democrata. Qualquer coisa que ameaçasse o poder governamental deste partido parecia para eles uma ameaça ao socialismo e então eles se viravam contra as correntes mais revolucionárias que, em sua opinião, criavam a possibilidade da contrarrevolução burguesa através da perturbação do governo do partido social-democrata. A direção bolchevique, por outro lado, via nos antigos agentes social-democratas os aliados de longo prazo do capital, que haviam se comprometido irremediavelmente durante a guerra. Eles acreditavam que apenas um partido verdadeiramente revolucionário (no sentido em que eles entendiam isso) podia empurrar o Estado numa direção socialista. Eles, portanto, queriam proclamar a insurreição armada como um meio de expulsar o grupinho social-democrata no governo e estabelecer seu próprio poder. A terceira tendência, por outro lado, se recusava a renunciar ao poder de conselhos estabelecido e lutava desesperadamente para mantê-lo. Contudo, como ela não foi capaz de resolver a principal questão da organização da economia, ela foi incapaz de lidar com as outras duas tendências.
20. Como com o partido social-democrata, a estrutura do partido bolchevique é a expressão de sua prática e de seu objetivo. Ele quer estabelecer o socialismo através do poder do Estado, não pela erosão gradual do capitalismo, mas pela destruição física da burguesia. Sua organização não podia ser falsamente democrática, tampouco, mas apenas indisfarçadamente ditatorial, centralista. Isto também é uma consequência de como ele quer mobilizar a classe trabalhadora, em outras palavras, unindo-a diretamente sob seu comando.
21. O contraste entre a social democracia e o bolchevismo é um de método, ao passo que em seus objetivos finais há certo grau de concordância. Ambos creem que o socialismo pode ser realizado pela organização de uma economia planificada pelo Estado. Suas diferenças correspondem apenas a como o poder estatal deve ser organizado, isto é, como o poder ditatorial de facto deve ser tornado aceitável para as massas. Ambos concordam em rejeitar a organização de poder autônoma dos trabalhadores. Os bolcheviques devem, portanto, ser vistos mais como oposição interna, ao invés de um movimento independente contra o democratismo social, cujo mandato é então usado como a característica geral da concepção socialista de Estado.
22. Durante e após os movimentos revolucionários que seguiram a Primeira Guerra Mundial, um conceito totalmente novo se desenvolveu entre alguns dos trabalhadores, alinhados com o trabalho dos teóricos revolucionários entre 1871 e 1914 e conduzido principalmente pela prática deste movimento de massas. Eles começaram a perceber que as organizações de empresa e os conselhos operários tinham uma tarefa muito mais ampla do que apenas organizar a democracia corporativa e a democracia política local; eles tinham de tomar toda a administração política e econômica da sociedade em suas próprias mãos. Como resultado da crítica dos revolucionários dos desenvolvimentos na Rússia, crescia a visão de que a abolição da propriedade privada dos meios de produção não era suficiente para o estabelecimento de uma sociedade comunista, uma vez que a concentração destes meios de produção nas mãos do Estado não havia abolido a separação entre produtor e meios de produção. Como um objetivo geral, eles buscaram: a abolição do trabalho assalariado, sendo uma expressão da separação entre produtor e processo de produção; a introdução de vales de tempo de trabalho como a base de uma nova organização econômica, transparente; organizações de empresa e conselhos operários como a fundação da democracia na sociedade. No entanto, a necessidade de uma economia planificada baseada na democracia de conselhos, bem como a maneira prática com que a classe trabalhadora tinha de implantar este programa, não foi suficientemente expressa.
23. Estas fraquezas nas formulações teóricas naqueles dias não eram acidentais. Elas eram a expressão da falta de organização na economia capitalista. A necessidade de introduzir uma economia planificada não parecia tão inevitável, parecia que as regulações gerais poderiam bastar. Ao mesmo tempo, não havia pontos de partida concretos para tal organização econômica a partir do qual se podia derivar a organização da empresa e os conselhos operários. Como resultado, as formulações teóricas tinham de permanecer limitadas dentro do mesmo quadro no qual os movimentos de massa revolucionários também encontravam seus limites.
24. As novas concepções de comunismo encontraram sua expressão em um novo conceito das tarefas e características do partido. O slogan “Todo poder aos conselhos operários [sovietes]” não podia ser conciliado com nenhuma das duas tendências do social-democratismo. O papel do partido agora estava limitado àquele de uma organização de esclarecimento e propaganda. Ele não procurava mais estabelecer o domínio sobre a classe. No entanto, porque os movimentos de massa ainda não haviam feito progresso nesta direção, esta tendência foi de novo e cada vez mais forçada a criticar as velhas ideias no princípio, sem ser capaz de desenvolver seu próprio ponto de vista positivo na prática. Como resultado, chegou mais ou menos à posição dos revolucionários do período de 1871-1914: ao passo que disponibilizam trabalhos teóricos valorosos, suas ideias ainda não podiam fertilizar a luta de classes real; e, logo, não podiam assumir a forma concreta que deveriam receber como poder real, material.
Organização do capitalismo pelo Estado. Oposição irreconciliável de todo o aparato à classe trabalhadora
25. No período entre as duas guerras mundiais e especialmente após a grande crise de 1929, uma nova organização do capital cresceu e as contradições entre os grupos de capital cada vez maiores se desenvolveu a um ponto tal que somente uma organização do capitalismo como um todo pelo Estado podia salvar o poder capitalista. O período de capitalismo liberal definitivamente tinha acabado. Baseado na exploração privada, ele não era a organização de uma economia planificada, mas uma organização limitada na qual a produção é deliberadamente empurrada em certa direção. A direção era aquela da produção de meios de guerra para manter e expandir o poder capitalista e do Estado. Ela era acompanhada pela subjugação total da classe trabalhadora pela organização de um enorme aparato de opressão. Ao invés de ser o “zelador” dos trabalhadores, o Estado surge como o organizador do empobrecimento absoluto da classe trabalhadora.
26. A Segunda Guerra Mundial em si e o período de exploração e opressão capitalista que a seguiram acentuaram catastroficamente esta tendência. A classe trabalhadora ainda se depara com a dura escolha da aniquilação radical do capitalismo ou sua própria queda física.
Os futuros movimentos de massa
27. Os movimentos de massa que devem vir não podem mais se desenvolver com base na conquista do Estado capitalista. O Estado se tornou muito claramente o inimigo mortal da classe trabalhadora. Isto é verdade independentemente se os assentos ministeriais são ocupados por membros de partido oficialmente burgueses, oficialmente socialistas ou oficialmente comunistas. Em todos os casos, a luta dos trabalhadores acontece na oposição irreconciliável a este Estado, não só contra os governos, mas também contra todo o aparato, incluindo velhos partidos e sindicatos. Uma vez que nenhuma oposição fundamental à organização da economia capitalista pelo Estado é possível com base em visões socialistas de Estado, os movimentos de massa devem se desenvolver não só em conflito com os órgãos oficiais destes velhos partidos, mas também contra toda sua visão.
28. No entanto, movimentos de massa não podem mais se desenvolver com base na democracia de conselhos no sentido limitado de 1918 e seu resultado. Os conselhos operários e organizações de empresa não podem mais se limitar à organização da democracia corporativa e da democracia política local. Pelo contrário, a parte mais essencial de sua tarefa é a organização de toda a economia da sociedade. Em primeiro lugar, eles devem chegar a regulações sociais gerais que são destinadas a organizar a produção e a distribuição usando os vales de tempo de trabalho de uma maneira completamente transparente. Mas isso não é o bastante. Pois não basta que a classe trabalhadora provoque uma distribuição justa dos bens de consumo produzidos. A exploração no capitalismo, e certamente na fase superior do capitalismo, assume a forma da produção de uma grande massa de bens que não serve para satisfazer as necessidades das pessoas, mas, pelo contrário, para destruí-las. A revolução dos trabalhadores deve, portanto, não só parar a produção de mais-valor para o capitalista, mas também deve mudar a forma física do produto que este mais-valor assume. A produção para a destruição deve ser transformada em produção para necessidades. É só ao fazer isto que a classe trabalhadora pode verdadeiramente pôr um fim à exploração que ocorre porque a maior parte do trabalho é despendida na fabricação de um produto que não tem valor, de fato pernicioso, para sustentar a vida da classe trabalhadora.
29. Tal conversão da produção, que cobre a maioria da economia da sociedade, não pode acontecer arbitrariamente, de uma maneira desorganizada. Pelo contrário, ela deve acontecer de uma maneira planejada. Na realidade, tão cedo quanto 1918, a classe trabalhadora se deparou com a mesma tarefa, embora naquela época a necessidade fosse menos óbvia do que é hoje. Contudo, mesmo então só teria sido possível superar a democracia de conselhos se tivesse sido possível avançar na organização de uma economia planificada. O fato de que isto não era possível naquela época é não só uma consequência de uma falta de compreensão entre os trabalhadores sobre a necessidade de tal organização. A economia capitalista ainda não havia construído a administração que era indispensável como a base de tal organização. Os conselhos operários, portanto, não encontraram qualquer ponto de partida concreto para tal medida.
30. Hoje, agora que o próprio capitalismo levou a cabo a organização da vida econômica, as possibilidades são completamente diferentes. É verdade, no entanto, que estas partes do Estado capitalista que estão envolvidas na regulação e administração da economia são igualmente hostis às lutas dos trabalhadores e não podem ser simplesmente “tomadas”; pelo contrário, elas devem ser destruídas; o fato de que elas já estão a serviço da organização da economia de destruição torna isto necessário. Contudo, o fato é que a capacidade de produção dos diversos ramos da economia foi administrada com precisão, o fato é que a oferta de matérias primas é canalizada por meio de cadeias organizadas de distribuição e o fato é que na regulação das relações entre os vários empreendimentos não só a lucratividade dos empreendimentos individuais, mas também o funcionamento do todo se tornou um fator certo. Ademais, em cada empresa, nós podemos encontrar dados precisos sobre o tempo de produção gasto em cada componente. Em vários institutos, se faz um estudo especial dos vários métodos de produção, os quais são examinados quanto à sua eficiência. Todos estes resultados administrativos, todos estes resultados de pesquisa de administração econômica e técnico-científicas são materiais indispensáveis para que uma economia planificada seja introduzida pela classe trabalhadora. Uma das tarefas mais importantes do poder de conselhos será apropriar os resultados da pesquisa e continuar a empurrá-los no interesse da classe trabalhadora em uma direção que corresponda a uma mudança da produção para as necessidades das pessoas.
31. A falta de movimentos de massa numa escala maior após a catástrofe da Segunda Guerra Mundial se deve em grande parte à necessidade da classe trabalhadora de se preparar para esta nova tarefa e às grandes dificuldades que ela encontra ao fazê-lo. Hoje, a luta pela conquista do poder está indissoluvelmente ligada à habilidade da classe trabalhadora de atacar os principais problemas da economia planificada com base na democracia de conselhos. Apenas a organização de empresa não é suficiente para isto e os conselhos operários, com as funções limitadas que tinham na revolução anterior, também não podem ajudar aqui. Nas revoluções anteriores, as organizações de empresa garantiram a democracia corporativa, os conselhos operários organizaram a democracia política local, mas só raramente intervieram no campo da economia e então apenas no que diz respeito à regulação da distribuição. A organização planificada da economia estava inteiramente fora de sua esfera de interesse.
Democracia na empresa. Conselhos operários e organizações de empresa
32. Na futura luta revolucionária pela conquista do poder, a classe trabalhadora deve desenvolver novos órgãos, organizações que tomam a democracia na empresa como seu ponto de partida, mas isso tem um âmbito de ação muito mais amplo do que a empresa individual. Assim como o capitalismo forjou toda a economia num todo indissolúvel ao qual o funcionamento do empreendimento individual foi completamente subordinado, de modo que a democracia industrial dos trabalhadores só pode existir se ela puder superar os limites da empresa individual e forjar um vínculo sólido entre eles. A organização necessária para este propósito não pode ser estabelecida por decreto nem pode nascer espontaneamente sem preparação prévia. A unidade dos trabalhadores é natural e espontânea apenas dentro da empresa individual; a unidade entre fronteiras deve ser conquistada em lutas difíceis. Em suas ações contra o capital organizado, os trabalhadores devem formar e consolidar esta nova unidade e o alargamento e o aprofundamento cada vez maior de sua unidade organizada fornecem a base para um alargamento e aprofundamento maior da luta. É necessário, contudo, que os trabalhadores controlem estas mesmas organizações, que resumem a unidade entre as diferentes empresas, já que do contrário toda a democracia industrial, incluindo aquela das empresas individuais, estaria fadada ao fracasso. Uma vez que toda ação depende desta unidade organizada entre empresas, uma vez que os trabalhadores em cada empresa dependem inteiramente de suas ações sobre o suporte ativo dos camaradas em outras empresas, está inteiramente fora de questão que uma organização que não exerça as ligações entre as diferentes empresas com uma função dos próprios trabalhadores em luta possa permanecer um instrumento nas mãos dos trabalhadores em qualquer outro contexto.
33. A nova organização só pode se desenvolver em uma luta incessante contra o capital organizado. Toda derrota, toda vitória, toda tentativa de evitar que o capital transforme uma vitória em outra derrota exige cooperação, cooperação organizada entre os trabalhadores em luta nas diferentes empresas, interlocalmente, inclusive internacionalmente. Conforme as lutas da classe trabalhadora se desenvolvem numa base mais ampla, a contra-ação da burguesia também avança numa frente mais ampla, necessitando assim de uma organização adicional e mais ampla da luta. Desta maneira, ação e organização crescem de mãos dadas. E, ao mesmo tempo, cresce a consciência dos trabalhadores de que esta organização é necessária e de que ela só pode ser bem-sucedida se os trabalhadores a mantiverem inteiramente em suas próprias mãos. Pois isto também é uma experiência que é repetida de novo e de novo na luta. Nesta luta, além dos sucessos temporários, a classe trabalhadora terá muito mais derrotas para suportar, derrotas que podem ser tão grandes que tudo que foi conquistado até agora está aparentemente destruído. Mas mesmo a pior derrota não está completa; a luta que foi, a organização que foi, vive nas mentes dos trabalhadores.
Apenas ali [nas mentes dos trabalhadores] está a compreensão de que os erros cometidos e as lacunas devem ser evitadas nas ações subsequentes, do modo que no futuro a luta deve ser organizada ainda mais amplamente, ainda mais vigorosamente. E também raramente a organização em si é destruída por completo. Permanecem uns poucos fios das antigas conexões organizadas pelas massas, mantidas por revolucionários conscientes nas diversas empresas. Estes fios formam o ponto de partida ao redor do qual a nova organização pode se cristalizar nas ações posteriores. Então parece que a nova organização surge de repente do nada, aparentemente espontaneamente, ao passo que na realidade a ação de massa anterior da qual os fracos fios de conexão permaneceram como resquícios teve de precedê-la como uma condição necessária.
34. Assim, há um elo indissolúvel entre os três elementos da luta dos trabalhadores por libertação, o crescimento da ação de massa, o crescimento da organização e o crescimento da consciência. Todos os três devem perseverar, não só contra o poder político e econômico do Estado capitalista, mas também contra seus aliados na forma de antigos partidos e sindicatos. Repetidamente eles tentam frear a luta dos trabalhadores. Eles tentam desencorajá-los ao promover demandas e abrir negociações, esperando, desta maneira, manter o proletariado longe da ação autônoma com a qual os trabalhadores surpreendem o capital sem anunciar. E quando, em alguns casos, estas organizações aparentemente apoiam a luta, elas são ainda mais perigosas. Ao atrair todas as funções exercidas pelos trabalhadores em luta, eles deixam estes trabalhadores indefesos. A intervenção destas organizações e a confiança residual dos trabalhadores em sua utilidade, que ainda não foi completamente perdida, levará a muito mais derrotas. Mas os trabalhadores também aprenderão com estas derrotas. Eles aprenderão a necessidade absoluta de manter o controle da luta em suas próprias mãos, incluindo a organização das conexões entre as empresas. Desta maneira, os trabalhadores serão forçados novamente a construir sua organização, materialmente em suas formações de poder reais, espiritualmente nas mentes como consciência de sua necessidade absoluta e da natureza de seu conteúdo. Logo, na luta, a organização cresce material e espiritualmente e, com a organização, a luta cresce.
35. Não há diferença entre esta organização em luta e a organização que os trabalhadores terão de usar para regular a economia, uma vez que a luta de classes tiver atingido o auge no qual os trabalhadores podem progredir rumo a tais medidas. Na luta, eles desenvolvem uma organização que também pode ser usada para este propósito. Precisamente porque esta organização também é necessária para o exercício do poder e porque ela só pode se desenvolver em uma luta prolongada contra o capital, o “período heroico” da revolução proletária, no qual o proletariado poderia, por um ato importante único, tentar subjugar toda a sociedade, definitivamente acabou. A prática da ação de massa rompeu para sempre a ilusão, tomada da era burguesa, de que a revolução pode ser um grande ato heroico. Pelo contrário, ela se torna um processo laborioso de luta, de organização e de consciência na sucessão contínua do que parecem ser vitórias ou derrotas.
Nenhuma vitória e nenhuma derrota, contudo, são definitivas porque elas são todas apenas o ponto de partida para outras lutas até que os trabalhadores possam assumir as diversas funções sociais, econômicas e políticas através de sua organização.
Tarefas e características do novo partido
36. Neste processo de se tornar consciente e lutar conscientemente, o partido revolucionário cumpre uma grande e necessária tarefa. Sua tarefa consiste, em primeiro lugar, de apoiar esta consciência. A lição a ser retirada da vitória e da derrota e da qual os trabalhadores individuais tomam mais ou menos consciência é formulada pelo partido e levada às massas usando sua propaganda. É “a ideia” que se torna poder material assim que se apodera das massas. Este poder material de transformação da ideia, como foi formulado por Marx, só pode se tornar realidade quando é proclamado em alto e bom som, quando se torna uma parte comum consciente do pensamento dos trabalhadores. Para que isto aconteça, é uma precondição que exista uma organização que leve o pensamento dos trabalhadores individuais a uma formulação deliberadamente expressa, pura. O partido que tem de fazer isto não é nem o posto de comando sobre nem o centro de pensamento dos trabalhadores; é, no entanto, um ponto central no qual todos os pensamentos germinantes se unem, no qual a consciência em desenvolvimento dos trabalhadores está concentrada e expressa. Concebido desta maneira, o partido não pode se desenvolver em oposição aos trabalhadores; ele obtém seus sucos vitais da classe em luta e em termos de consciência, crescente; ele só pode viver desde que esta conexão íntima com a classe permaneça.
37. Este processo geral de consciência e a atividade relacionada do partido têm muitos aspectos. O que todo trabalhador sente, a insustentabilidade da situação, a necessidade absoluta de destruir o capitalismo, deve ser resumido pelo partido em formulações claras. A questão deve ser examinada em seu contexto, a resposta deve ser dada com clareza e inevitabilidade científica. A posição tomada sobre a organização da sociedade comunista e suas características essenciais, a abolição do trabalho assalariado e da exploração (incluindo a exploração pelo Estado) e a organização da economia pela democracia de conselhos baseada em vales de tempo de trabalho deve ser igualmente clara. A necessidade da organização de uma economia comunista planificada deve ser demonstrada, assim como a maneira com a qual ela pode ser alcançada pela classe trabalhadora. Esta é uma área quase inexplorada para a atividade do partido e que é de grande importância. É necessário esclarecer como o proletariado deve construir sua organização de poder. Todas as tentativas astuciosas da burguesia e de seus cúmplices de contaminar as organizações dos trabalhadores com sua influência devem ser desmascaradas. O bacilo insidioso do lento desmantelamento do direito de autodeterminação dos trabalhadores deve ser rastreado e identificado. A tarefa do partido no processo de consciência e educação é multifacetada. Ele deve estar sempre vigilante contra os perigos que ameaçam a luta dos trabalhadores. Como os mais comprometidos conscientemente, a parte mais educada da classe, o partido intervém para primeiro reconhecer os perigos ameaçadores, para primeiro reconhecer oportunidades para novas organizações de poder primeiro e ele deve lutar para que sua compreensão seja substancialmente utilizada pelos trabalhadores, ao propagá-la com palavras e, se necessário, intervir para que seu exemplo empurre a classe trabalhadora para cima em sua luta.
38. A intervenção prática do partido na luta de classes não é a parte menos importante de sua tarefa. Certamente, ele só pode intervir como parte da classe e não em oposição a ela. Certamente, sua ação só pode servir para aprofundar e estender a área de poder da democracia de conselhos, não para retirar funções dos trabalhadores. A última violaria sua concepção inteira, sua estrutura inteira, a prática de toda sua propaganda e suas ações diárias. No entanto, onde os trabalhadores hesitarem para implantar certas medidas, os membros do partido, como trabalhadores revolucionários nas empresas, podem e devem tomar a iniciativa quando a implantação destas medidas for possível e necessária. Quando os trabalhadores quiserem deixar o surto da ação para uma direção sindical, os comunistas em questão devem tomar a iniciativa para sua ação. Quando, em uma fase superior da luta, as organizações de empresa e os conselhos dos trabalhadores se intimidarem diante da questão da organização da economia, os comunistas envolvidos devem não só lembrá-los desta necessidade, mas eles também devem estudar eles mesmos estas questões e convocar reuniões da empresa para discuti-las. Desta maneira, sua atividade ocorre na luta e, como a força motriz da luta, quando ela estagna ou ameaça se desviar.
39. Não há outro limite para a atividade do partido senão aquele que expressa seu compromisso com a classe. Ajudar uma ação de massa, por iniciativa própria, a superar o ponto morto, quando a massa, por certa dificuldade a ser superada, recua e, se agarrando às conexões feitas pela ação de massa quando ela é reprimida, tudo isto pode pertencer às tarefas do partido. No entanto, toda esta atividade tem um sentido revolucionário no desenvolvimento da ação de massa apenas quando o partido atua como parte da classe e também é considerado e reconhecido pelos trabalhadores como a parte mais conscientemente em luta de sua classe. Para que o partido degenere no sentido de que ele retirará funções dos trabalhadores e as tomará em suas próprias mãos, não há outra garantia senão o apego à classe e à disposição revolucionária de seus membros. Quanto esta relação não existe, quando o partido é um órgão fora da classe, ele não tem escolha senão se colocar fora da ação, de uma maneira derrotista, ou subordinar os trabalhadores à sua liderança imposta. Assim, o partido só pode ser verdadeiramente revolucionário se estiver ancorado nas massas de modo tal que sua ação é indistinguível daquela do proletariado em geral, exceto no sentido de que a percepção, a aspiração e a vontade conscientes da classe trabalhadora estão cristalizadas dentro dele.
40. A nova tarefa do partido no movimento de massa, a nova concepção do propósito deste movimento, também determina a estrutura do novo partido. Seus membros devem ser ativistas autônomos com sua percepção e julgamento. Vinculados às visões gerais e de princípios do partido, que também são suas visões, eles têm que defender e implementá-las sob todas as circunstâncias. Eles não conhecem a disciplina cadavérica da submissão renitente às decisões; eles só conhecem a obediência de sua convicção interna, que tem origem na visão de princípios e, no caso de um conflito organizacional, esta convicção é o fator decisivo. Mas tais conflitos serão raros uma vez que as decisões organizacionais são uma apenas expressão da convicção de princípio dos membros e de sua boa vontade em realizar esta convicção de formas concretas. Os membros assumem um papel ativo no aprofundamento da compreensão que é não só realizada através do estudo teórico, mas também, e acima de tudo, através da participação constante nos movimentos de classe do proletariado. Na realidade, estes dois elementos de consciência estão indissoluvelmente ligados, pois a experiência obtida na luta só se pode fazer realmente útil através da conexão com o insight teórico, ao passo que o estudo teórico, por outro lado, só pode ser fertilizado pela prática da luta de classes. Cada membro do partido, portanto, tem de participar ativamente na luta de classes e, ao mesmo tempo, tem o dever igualmente importante da educação teórica. Apenas a conexão entre estes dois elementos de consciência e de luta o torna um membro valoroso do partido comunista.
41. Esta autoatividade dos membros, esta educação geral, esta participação consciente nas lutas dos trabalhadores torna impossível qualquer criação de uma burocracia do partido. Através de meios organizacionais, no entanto, seria impossível encontrar medidas adequadas na ausência desta autoatividade e educação por parte dos membros; mas, nesse caso, o partido não seria mais considerado um partido comunista. O partido comunista real, para o qual a autoatividade da classe é a ideia de suporte, é o partido no qual esta ideia se tornou carne e sangue entre seus membros. Por este motivo, seria necessário privar os membros de seu julgamento independente e de sua própria atividade, contra o que ser um comunista no sentido completo da palavra é uma garantia suficiente. Um partido com um programa comunista ainda pode degenerar, um partido consistindo de comunistas nunca. É por isso que todo membro deve se preparar até esse nível, porque somente ao exigir o máximo de si mesmo ele permitirá que o partido cumpra sua tarefa histórica na luta dos trabalhadores.
[1] O artigo original em holandês foi publicado pela Communistenbond “Spartacus” em Amsterdã no ano de 1945. A tradução para o português foi realizada a partir da tradução para o inglês realizada por Fredo Corvo (Tasks and Characteristics of the New party). Em holandês: Taak en Wezen van de Nieuwe Partij. [N. T.]
[2] Referência ao Capítulo 24 do primeiro livro de O capital, cujo título é comumente traduzido como “acumulação primitiva”. [N. T.]
[3] Em nossa tradução utilizamos “organização de empresa” para traduzir o termo holandês bedrijfsorganisatie, derivado do alemão Betriebsorganisation. Este termo, como Corvo afirma em nota à tradução para o inglês deste mesmo artigo, “tinha um sentido específico para a esquerda comunista alemã e holandesa, indicando a organização informal autônoma da luta dos trabalhadores em seus locais de trabalho (empresas) e sua organização formal no nível da ‘loja’ após a revolução; o termo frequentemente foi traduzido equivocadamente como “organização de fábrica” e até mesmo retraduzido ao alemão como Fabriksorganisation, um termo mais restrito que foi mal utilizado para sugerir que o comunismo de conselhos tinha uma concepção que se limitava à chaminé da fábrica”. Optamos por “organização de empresa” ao invés de “local de trabalho” por considerar o último um tanto desajeitado. [N. T.]
Traduzido por Thiago Papageorgiou.
Why are in most theses the last 3 sentences (or more) repeated, 3 or more times? If it is a new way of trying to convince readers, for me the effect is counterproductive.