Um operário entre intelectuais[1]
Esta entrevista, transcrita recentemente de um documentário italiano, é verdadeiramente única. Leitores novos e experientes devem gostar dos detalhes sucintos e ricos da vida de Paul Mattick, direto da fonte. Em uma tentativa de ser fiel à obra original, um pequeno número de edições foram feitas para uma experiência de leitura melhorada[2].
Entrevistador:
Quando esta entrevista ocorreu, Paul Mattick vivia ao pé da Stratton Mountain em Vermont, a região [ele provavelmente queria dizer estado] no nordeste dos Estados Unidos, perto da fronteira com o Canadá. Ele tinha 74 anos, não estava cansado e estava escrevendo outro livro, um livro sobre as teorias econômicas mais recentes.
Nascido em Berlim em 1904, Paul Mattick morreu em 7 de fevereiro de 1981 nos Estados Unidos, onde vivia desde 1926. Foi um dos economistas modernos mais importantes da tradição marxista. Morava em Cambridge, na cidade universitária americana perto de Boston, mas passava muitos meses do ano aqui em Vermont, rodeado pela natureza, longe da poluição. Mattick era um personagem curioso, difícil de definir e de catalogar. Conhecido apenas por um grupo muito pequeno de especialistas, foi descoberto em 1968 pelo movimento estudantil. Marcuse era o filósofo; ele, o economista. E com ele, ocorreu um retorno do (de um novo) socialismo libertário, um comunismo crítico e antiautoritário, o qual não ficava recluso em livros e obras, mas que vinha sobretudo das experiências de vida.
Paul Mattick sempre se recusou a dar entrevistas de caráter pessoal e autobiográfico. “Esta é a primeira e última vez”, disse. Não gostava da publicidade. Escreveu livros, organizou conferências, mas sempre permaneceu o jovem rebelde que participou da revolução alemã de 1918-1919 e do movimento de desempregados nos Estados Unidos no começo dos anos 1930.
Ensinando em universidades, participando de debates e conferências internacionais, indo parar nas páginas de diversos jornais como “um dos professores que inspirou os estudantes rebeldes”… tudo isto não o mudou de modo algum. Permaneceu fiel à sua vida aventureira e intransigente de operário rebelde.
Revolta e Revolução
Paul Mattick:
Eu cresci numa família na qual meu pai, ainda que de maneira superficial, se orientava por ideais socialistas e era membro do sindicato. Durante minha infância, tive a chance de escutar a muitas conversas sobre os muitos tipos de movimentos operários: os sindicatos livres, as coalizões, o partido socialista, as cooperativas, mas nenhuma destas me impressionou muito.
A minha primeira experiência com o movimento revolucionário foi durante uma revolução de bitola estreita[3]. Um dia, em 1916, minha mãe veio e me falou: “Menino, começou uma revolução!”. Pegamos a Berliner Straße no bairro berlinense de Charlottenburg, onde morávamos, e havia uma grande multidão que estava sendo atacada pela polícia montada, mas a multidão era tão grande que os policiais literalmente desapareceram na turba. Naquela época, as mulheres costumavam pentear o cabelo com grampos muito longos… eu vi uma mulher ser empurrada contra uma casa; ela tirou seu grampo e espetou o cavalo. O cavalo se empinou e outra mulher – a maioria dos manifestantes eram mulheres – derrubaram o policial da sela e começaram a chutá-lo. Esta foi a primeira manifestação revolucionária que pude assistir. Todas as lojas, aquelas sem venezianas, foram assaltadas e as mercadorias foram redistribuídas. Mas neste momento, um grupo maior de policiais chegou e começou a atirar, forçando a multidão a se retirar. Esta manifestação ocorreu como parte de uma greve que acontecia nas fábricas de Berlim. A greve foi convocada para barganhar por melhor alimentação e para protestar contra os cartões de racionamento. Esta foi a consequência direta de um discurso feito por Karl Liebknecht na Potsdamer Platz, mas agitações deste tipo eram muito frequentes. Dava pra sentir no ar que as massas estavam rumando a formas de oposição de caráter revolucionário e isto estava evidente, por exemplo, em seu comportamento.
Este primeiro exemplo de atividade revolucionária ficou marcado em minha mente. Para mim, foi uma experiência extremamente excitante. Desde que fiz 14 anos e terminei meus estudos, me filiei, com autorização de meu pai, à “Juventude Socialista Livre”, em Charlottenburg, minha região, que contava com cerca de 200 jovens. Lá me formei politicamente, às vésperas da revolução.
Durante a revolução de novembro, eu já estava trabalhando como aprendiz na Siemens, onde fui contratado em março de 1918. A greve, que foi promulgada na Siemens e em outras fábricas também após a revolução alemã de novembro e a proclamação da república, foi um momento (a criação de) de muitas assembleias lotadas nas fábricas. Como eu era socialista e era considerado o porta-voz dos aprendizes, fui eleito para o conselho da fábrica. Tive a chance de entrar em contato com outros conselhos de outras fábricas e, quando nossa usina foi fechada, nós caminhamos pelas ruas. Naturalmente, as ruas estavam vivas com o entusiasmo… as pessoas caminhavam freneticamente. Se você encontrasse um policial, você arrancava as fitas do uniforme dele… eles estavam desarmados e às vezes eram agredidos, também.
Houve alguns conflitos no entorno do Portão de Brandenburgo. Grupos de soldados reacionários que não queriam participar da revolução se mobilizaram contra os operários, os quais, nesse meio tempo, se armaram indo aos quartéis e fraternizando com os soldados. Caminhões cheios de pessoas percorriam as ruas dia e noite. Bandeiras vermelhas eram levantadas e alguém [inclusive] atirou contra o telhado em que os franco-atiradores se abrigavam. Nós jovens queríamos participar destes eventos, então, um dia, no meio da noite, eu pulei num caminhão. Um espartaquista, vendo como eu era jovem, me perguntou “Você sabe como funciona uma pistola?” e obviamente respondi “claro que sei!”. Então, ele perguntou “onde é a trava de segurança?” Não fazia ideia de onde era, então ele me empurrou pra fora enquanto o caminhão disparava em alta velocidade.
Naquele mesmo período, vi Rosa Luxemburgo pela primeira e última vez. Ela estava conversando com a multidão de cima de uma balaustrada do Reichstag. Também vi Karl Liebknecht em um parque no qual uma multidão se reunia. Isso foi em janeiro de 1919. Tinha operários e soldados armados. Foi nesses dias que ocorreram os famosos “conflitos de janeiro” (as revoltas de janeiro) que deram início às eliminações físicas dos militantes espartaquistas. Todos nós vivíamos nas ruas e tentávamos colaborar com o movimento revolucionário de todas as maneiras possíveis, a despeito de nossas limitações. Porém, a nós jovens, eles normalmente davam baldes de cola e esfregões com a tarefa de colar cartazes durante a noite.
O movimento revolucionário acabou quando aqueles que lutavam na linha de frente foram derrotados. Boa parte deles em Berlim era de nosso grupo de Charlottenburg. Dentre eles, havia inclusive um membro do parlamento morto pelos guardas brancos. A fase revolucionária acabou com a derrota militar do movimento Espartaquista. A Liga Espartaquista era um grupo relativamente pequeno de revolucionários e o terror branco o aniquilou. Reacionários e fascistas literalmente começaram a caçar de porta em porta, matando todos que fossem encontrados em posse de certas publicações e de certos livros. Durante as lutas, mas especialmente depois delas, apenas em Berlim, os guardas brancos mataram mais de 2 mil pessoas. Neste momento, a greve acabou da mesma maneira que todas as outras greves acabaram e o humor das pessoas se dirigiu contra os espartaquistas. A maioria dos operários, especialmente os operários social-democratas, pensou: “Nós fazemos a revolução e agora os espartaquistas a estão estragando. Os espartaquistas querem chegar imediatamente em alguma coisa como o bolchevismo em vez de usar nossas conquistas e começar um processo gradual. Eles só geram desordem em um momento em que a disciplina mais rigorosa seria a mais necessária. A gente está falando de elementos indisciplinados que levarão à destruição da revolução”. Era assim que eles pensavam. O fato é que eram os guardas brancos que a estavam destruindo. Então, seguindo as diretrizes do sindicato, a massa operária retornou às fábricas e a greve acabou. A derrota só foi reconhecida nas assembleias seguintes. Mas naquele momento, não havia o que fazer. Berlim estava ocupada pelo exército e a mesma coisa também acontecia em outras cidades alemãs.
Entrevistador:
Paul Mattick era ferramenteiro. Sempre ligado politicamente à ala mais radical do movimento operário, nunca mitificou os operários. Como faria isso? Eram os intelectuais que pintavam uma imagem compacta e revolucionária da classe operária. Mattick, pelo contrário, era realista; tinha visto como a classe operária, no começo da 1ª Guerra Mundial, tinha sido vítima da histeria nacionalista e marchado cantando em favor da guerra a despeito dos princípios pacifistas que sempre proclamara.
Paul Mattick:
No começo da 1ª Guerra Mundial, toda a população da Alemanha estava entusiasmada com a guerra. Em 1914, os dirigentes do movimento operário, que em parte não refletiam o entusiasmo das multidões, aceitaram este estado de coisas para não serem engolidos pela onda de chauvinismo que havia envolvido os seguidores dos partidos e sindicatos do movimento operário. A classe operária foi integrada ao sistema, seja ideologicamente, seja do ponto de vista da organização. Naturalmente, ninguém imagina como tudo ia acabar e só um ano depois do começo do conflito, até mesmo o entusiasmo se desfez em todos os países em guerra, dando lugar a miséria, ao sofrimento e a insatisfação cada vez mais visíveis.
Entrevistador:
Depois da Revolução Russa de 1917, no final da guerra, os alemães também tentaram (a revolução). Mas depois da proclamação da república e do fracasso do movimento insurrecionário espartaquista de janeiro de 1919, a onda revolucionária se atenuou. Paul Mattick, jovem espartaquista, aceitou a fundação do partido comunista alemão, mas se encontrou na oposição desde o início. O grupo do qual fazia parte, que depois se separou do partido, criticou ferozmente a União Soviética e suas tentativas de controlar os partidos comunistas ocidentais. As críticas, porém, foram direcionadas contra a social-democracia, a qual se tornara partido governante nesse meio tempo. O movimento operário alemão foi então dividido em grupos e seitas menores que tinham concepções divergentes quanto ao significado de socialismo e às ferramentas para alcançá-lo. Não há dúvida, porém, de que a maior parte dos operários alemães não estava propensa a arriscar o pouco que possuíam em nome de um incerto futuro socialista.
Paul Mattick:
Os trabalhadores[4] revolucionários não faziam parte de determinada corrente, de uma categoria específica… se tratava, na verdade, de vários elementos da classe operária. Dentro dela, havia inclusive alguns pequeno-burgueses. Em nosso grupo, por exemplo, havia alguns intelectuais, estudantes. A maioria era de aprendizes como eu ou de trabalhadores diaristas. Como o movimento de juventude tinha vínculos íntimos com a Liga Espartaquista, então ocorriam muitas reuniões em comum, tive a chance de conhecer muitos membros do partido. Em sua maioria, eram operários, em que todo tipo de emprego estava representado no partido e não dá pra dizer que havia uma categoria específica de trabalhadores mais revolucionários que a outra. A característica principal da Liga Espartaquista era que a maioria dos membros eram operários fabris, ao passo que o grupo de intelectuais era muito reduzido e de fato irrelevante se comparado à massa operária. É por isso que o movimento espartaquista, desde sua criação, se atribuiu um programa antiparlamentar e antissindicalista. De fato, os operários estavam muito mais à esquerda do que os intelectuais como Rosa Luxemburgo e Paul Levi. Estes últimos não queriam forçar a situação. Diziam: “vamos esperar e ver o que acontece”. Além disso, achavam que a revolução teria ido adiante do mesmo jeito e se iludiram achando que a Rússia teria intervindo em favor da revolução alemã.
Entrevistador:
A Rússia de Lenin e de Trotsky não podia e não queria intervir. E mesmo em 1923, quando a crise econômica se agravou a tal ponto a situação que fez com que muitos pensassem que uma nova onda de sentimento revolucionário estava pra começar, o movimento operário, ainda dividido, não foi capaz de mudar as relações de poder na nova Alemanha republicana.
Paul Mattick foi influenciado fortemente pelos eventos de 1923, pela crise econômica e social e seu potencial revolucionário perdido. Ao ir embora de Berlim em 1921, Mattick se mudou para Hannover e depois para Bremen e eventualmente para Colônia. Ele vivia dia após dia, como muitos outros trabalhadores jovens; participava de ações políticas, das greves e das manifestações dos grupos da ala mais radical da esquerda, mas estes grupos foram cada vez mais marginalizados.
Paul Mattick não vivenciou o declínio da esquerda revolucionária europeia. Em 1926, o desejo de ver o mundo e uma passagem dada de presente a ele por um parente distante fizeram com que ele fosse para os Estados Unidos.
Rumo aos Estados Unidos! Rumo à aventura!
Paul Mattick:
Já a bordo do navio que me trouxe aos Estados Unidos em 1926, compreendi que a imigração era uma espécie de pilhagem perpetuada por todos em detrimento dos trabalhadores. O que era feito por toda a tripulação no navio: os médicos, as escoltas[5], as anfitriãs, etc. Todos tentaram tirar o dinheiro que os imigrantes tinham. Por exemplo, o médico podia dizer ao paciente coisas do tipo: “Com esta ferida, com esta doença, você não conseguirá chegar aos Estados Unidos, mas posso te passar uma pomada especial por só 20 ou 50 dólares e, com ela, seus problemas e sua doença estarão resolvidos”. No navio, houve até mesmo uma rebelião. Um despenseiro que se recusou a nos servir café porque não lhe pagamos um dinheiro extra foi agredido com sua própria cafeteira. Quem se rebelou foi detido; nos esforçamos bastante para nos organizarmos para lutar contra os abusos. Eu mesmo organizei os passageiros para confrontar a opressão daqueles que ditavam as regras a bordo.
Quando chegamos a Nova York, na Ellis Island, as autoridades provavelmente já tinham sido avisadas de que nem tudo tinha corrido sem problemas a bordo. Deste modo, mais tarde, descobri que a maneira com que fomos recebidos na Ellis Island não foi nada especial. Era parte do tratamento normal reservado a imigrantes. Antes de tudo, os homens eram separados das mulheres e forçados a se despir completamente em umas câmaras enormes. Eram salas muito frias e úmidas. Tivemos que ficar em pé, nus, esperando que o médico examinasse todos nós, um de cada vez. Se o exame corresse bem, o médico dizia “Vá para a direita!”; se não estivesse satisfeito, dizia “Vá para a esquerda!”. Assim, se formaram duas filas: para aqueles à direita, que aparentavam estar em boas condições médicas, davam o visto de entrada. Quanto a mim em particular, encontraram uma fratura que eu não tinha e me mandaram entrar na fila da esquerda, o que fiz num primeiro momento, mas depois entrei discretamente na fila da direita num momento em que ninguém estava prestando atenção. Depois disso, chamaram todos para irem para a frente de um guichê para responder algumas perguntas capciosas. Antes de tudo, perguntavam quanto dinheiro você tinha e se poderia receber remessas de dinheiro. No caso de uma resposta negativa, eles perguntavam se você sabia ler e escrever e algumas perguntas para avaliar sua inteligência. Por exemplo, perguntaram a um fazendeiro russo que estava em pé perto de mim “Por que os gatos têm 5 pernas?” O homem ficou completamente confuso, não sabia nem se realmente existia um animal assim. Ele não conseguiu responder essa pergunta, então foi declarado “com deficiência intelectual”. Devia ter respondido “o gato só tem 4 pernas!”, mas sequer imaginou que a pergunta era tão burra. É bem provável que este tratamento não fosse diferente daquele usado nos campos de concentração alemães durante a primeira fase. A primeira impressão dos Estados Unidos era de um país que tratava as pessoas de uma maneira extremamente cruel e terrível. Imigrantes eram considerados animais e já que muitos não falavam inglês, lhes davam números grandes para vestir até que chegasse a seu destino. A Ellis Island provavelmente foi um dos maiores crimes cometidos pelos Estados Unidos contra a humanidade. Se as condições permaneceram sempre iguais àquelas que vi em 1926, então a Ellis Island é uma mancha vergonhosa na história americana.
Depois de vir para os Estados Unidos em 1926, me vi numa situação na qual a prosperidade crescente criou as condições para uma especulação indômita na bolsa de valores. Até mesmo os trabalhadores, assim como os capitalistas, com menos meios, se dedicavam à especulação. Nas fábricas, como aquelas nas quais eu trabalhava, a primeira coisa que os operários olhavam no jornal era a situação das ações na bolsa de valores para verificar se suas ações tinham caído ou aumentado e, naturalmente, as ações subiam, afinal a gente está falando do capital fictício. E nesta escalada frenética das ações, já estavam plantadas as sementes da crise que explodiu pouco depois. Porém, os trabalhadores estavam tão integrados ao sistema que, as massas, à exceção dos trabalhadores organizados, que eram uma pequena minoria, não tinham nenhum tipo de interesse ideológico. Estavam somente interessados em esportes, tempo livre e no mercado de ações. Fiquei sem palavras quando percebi que era o único em uma fábrica de 500 operários a me informar em 1927 sobre o que estava acontecendo com Sacco e Vanzetti[6] e a perguntar o que deveríamos de fazer com relação a isso. Nenhum dos 500 trabalhadores sabia quem eram Sacco e Vanzetti. Por exemplo, o movimento de Boston, que fez tudo que podia para salvar Sacco e Vanzetti da pena capital, não foi apoiado pelas organizações dos trabalhadores, apenas pela burguesia liberal e alguns intelectuais que estavam interessados nessa iniciativa por motivos humanitários e morais. Os trabalhadores[7] sequer sabiam os nomes de Sacco e de Vanzetti.
É interessante ver como pouquíssimo depois, depois da crise de 1929 e já em 1930, tanto trabalhadores e desempregados tinham uma atitude completamente diferente. Sem serem minimamente influenciados no plano ideológico e em uma situação na qual a velha ideologia otimista não funcionava mais em comparação à realidade, os trabalhadores começaram a se fazer perguntas diferentes.
Podemos dizer que a ideologia não é importante. A ideologia tem a capacidade de ser efetiva apenas quando está em contato com uma realidade que não a contradiz. Quando o contraste entre ideologia e realidade se torna profundo demais, os trabalhadores não agem de acordo com sua ideologia, mesmo que ainda acreditem nela ou não a tenham abandonado, mas a colocam de lado e agem com base nas necessidades do momento. Partindo de suas necessidades e da guerra de classes que nasce de suas necessidades, criam uma ideologia criada por suas necessidades. Isto significa que o primeiro empurrão não é ideológico, são as necessidades práticas, as necessidades reais que determinam a ideologia. Este é um fato muito importante, pois nos permite superar o pessimismo. Por experiência, sabe-se que esta classe operária estúpida e entorpecida não deve necessariamente permanecer assim e que, em pouco tempo, a situação pode mudar. A classe operária, mesmo que não pense de modo teoricamente ortodoxo, pode desenvolver uma consciência de classe a despeito das ideologias burguesas dominantes.
No movimento dos desempregados
Paul Mattick:
A crise econômica de 1929 se difundiu com extrema velocidade; apenas um ano depois, em 1930, já havia 16 milhões [de pessoas] de desempregados. Ademais, não havia nada que pudesse mitigar as condições destes desempregados, não existia nenhuma forma de assistência social, salvo por fundos assistenciais de cada cidade individual, os quais foram esgotados imediatamente. Também havia um fundo de assistência nacional, mas que não durou muito. Isto forçou o governo a se ocupar com o desemprego e a adotar medidas para enfrentar o rápido agravamento da situação. Em um momento no qual não havia propriamente um movimento sindical com uma influência real sobre as massas trabalhadoras, os desempregados tiveram que se organizar eles próprios. Os centros assistenciais de cada cidade foram os únicos lugares aos quais os desempregados podiam recorrer para buscar ajuda. Estes centros se tornaram o lugar natural de assembleia dos trabalhadores para protestar contra os baixos subsídios e as condições de vida miseráveis. Desta maneira, assim como nas fábricas, grupos de ação se formaram perto dos centros de assistência de cada bairro, assim como se formaram espontaneamente os grupos de socorro.
Se alguém fosse despejado porque não tinha como pagar seu aluguel e seus móveis fossem colocados na rua, estes grupos intervinham, ajudando a pessoa a colocar seus móveis de volta na casa, forçando, assim, as autoridades a renegar a ação de despejo. Estes grupos espontâneos chegaram ao ponto de ocupar lojas que haviam falido para utilizar como locais de reunião. Estes locais eram equipados, por exemplo, com cadeiras de cinemas antigos ou com cozinhas públicas, as quais eram usadas para alimentar os desfavorecidos.
Durante o inverno de 1930, a situação era tão dramática que, em Chicago, pelo menos 200 ou 300 pessoas morriam todos os dias embaixo das pontes por congelamento; não tinham nada com o que se cobrir à exceção de alguns jornais e o frio era tal que morriam congelados durante o sono. Na manhã, os caminhões passavam para recolher os cadáveres e os levar para serem enterrados. Tudo isto ocorria à luz do sol e as pessoas tinham consciência disso: criou-se uma situação praticamente pré-revolucionária.
Por exemplo, em Chicago e em Nova Iorque, com distribuição de folhetos era possível levar 1 milhão de pessoas às ruas dentro de apenas 24 horas. A polícia não sabia como fazer frente à situação, as forças da ordem estavam tão completamente sitiadas pelas massas, estavam tão cercadas que não conseguiam nem sacar as armas. As ruas estavam totalmente de cabeça pra baixo, os bondes arrancados dos trilhos, havia barricadas em todo lugar e começou a se desenvolver uma ação revolucionária, sem ideologia alguma. Não obstante, nestas circunstâncias, o movimento não teve outra oportunidade senão aquela de obrigar o governo a adotar medidas para reduzir o desemprego.
Nós, que éramos ativos no interior do movimento dos desempregados, entendemos que a situação era revolucionária, mas não acreditávamos que poderia resultar em pouco tempo numa revolução. Apesar da crise, o capital ainda estava muito poderoso e muito bem organizado, e nós só podíamos, em termos de medidas imediatas, forçar a burguesia a adotar uma política de despesas públicas para garantir assistência e reduzir o desemprego. A burguesia, no entanto, tem uma percepção da realidade totalmente diferente. A menor das manifestações com desordem nas ruas, as revoltas, eram considerados de súbito o início de uma revolução. Ao passo que os trabalhadores nem pensam minimamente sobre a revolução, a burguesia, ocupada com a luta de classes também para defender seus interesses, está muito assustada, já que tem medo de que o sistema possa ser derrubado, para se darem a razão, a ocasião, da insurreição da ação revolucionária.
Tudo que aconteceu nos Estados Unidos depois da crise de 1929 é um ótimo exemplo. Com a intensificação das manifestações de massas, e quase todos os dias havia uma manifestação, a polícia e a guarda nacional apareciam com as motocicletas, com o fight car, armadas com metralhadoras. Atiravam imediatamente nas multidões para dispersar as pessoas, matando mais ou menos uma dúzia de pessoas e ferindo muitas outras. O medo da burguesia tornou o confronto mais sangrento, e este medo, aliado ao agravamento do confronto, levou à queda do governo.
Nos Estados Unidos, já que a opinião popular considera que fazer política é um esforço, quando uma administração não é capaz de melhorar uma situação, considera-se que a seguinte será capaz de fazer melhor. Pelo menos estas são as expectativas no começo e é por causa disto que o poder executivo passa das mãos dos republicanos àquelas dos democratas e vice-versa, seguindo o fluxo de crise e de momentos de prosperidade do país.
Entrevistador:
Por exemplo, no começo dos anos 30, quando Roosevelt foi eleito presidente dos Estados Unidos, todos olhavam para essa administração como a única possibilidade de salvar o povo da depressão econômica; todos, inclusive expoentes de esquerda, sejam socialistas como comunistas, todos estavam fascinados pelo governo Roosevelt e o apoiou completamente. Lembro que naquele momento, Mattick escreveu um artigo em que dizia: “As pessoas não devem contar com o governo, com o governo de Roosevelt, para resolver a crise, os trabalhadores devem e só podem contar com si mesmos. Este é o único modo real e duradouro de resolver verdadeiramente uma crise econômica”. Nesse artigo, Mattick deu um exemplo de tudo que acontecia nas zonas de minério americanas. Os mineradores, cuja situação era verdadeiramente desesperadora, tomaram as minas, ignorando as diretivas das empresas de minério, extraíam o carvão e o vendiam diretamente, criando uma indústria alternativa e autônoma, uma indústria gerida pelos próprios trabalhadores. Segundo Mattick, este fenômeno era um exemplo de como um processo revolucionário podia nascer em um país como os Estados Unidos. Segundo ele, as coisas não podiam mudar com um novo governo nem recorrendo às burocracias partidárias de esquerda, mas apenas através da ação de massas e do controle autônomo da produção pelos trabalhadores. Terão de ser os mesmos operários que, um dia, se apossarão da indústria e a dirigirão em benefício da população como um todo.
Os anos de reflexão
Paul Mattick Jr.:
Nasci em 1944 e minhas primeiras memórias de infância em relação às atividades de meu pai são de 1950. Eu tinha 6 anos de idade. Naquela altura, o movimento político da esquerda já tinha acabado há 20 anos nos Estados Unidos. Ainda assim, lembro que ainda aconteciam reuniões na minha casa, que muitas pessoas vinham nos encontrar, que discutiam política. Eram grupos pequenos, o pouco que ainda restava dos intelectuais que eram politizados nos anos 30. Muitos eram militantes marxistas, outros militantes de ascendência europeia como Karl Korsch, todos que, em suma, permaneceram ligados a certas ideias e que vinham até nós discuti-las. No começo dos anos 50, meu pai, minha mãe e eu deixamos Nova York, nos mudamos para Vermont. A razão de deixarmos a cidade grande se devia em grande parte ao fato de que naquela época o interesse político das pessoas havia desaparecido. Não tinha nada pra fazer além de se retirar para estudar e, nos Estados Unidos da época, até mesmo os intelectuais de esquerda tinham desaparecido.
Entrevistador:
Paul Mattick viveu em retiro em Vermont por quase 10 anos, em uma pequena casa pintada de vermelho que ele próprio construiu, muito perto de um riacho, ajudado pela esposa e pelo filho. Estes são os anos de reflexão.
Aqui, escreve sua obra-prima, um livro de teoria econômica e de crítica da economia, intitulado Marx & Keynes, no qual Mattick propõe novamente a análise marxista para o estudo do desenvolvimento capitalista e para uma crítica da assim chamada “economia mista”, da qual Keynes é o teórico mais importante. Mattick já tinha se envolvido com a economia nos anos 30; com um amigo, Karl Korsch, um dos maiores pensadores marxistas, obrigado a deixar a Alemanha pelos nazistas, Mattick publicava algumas revistas nas quais havia iniciado uma análise sobre as profundas mudanças econômicas que haviam intervindo no mundo econômico moderno após a crise mundial de 1929.
Com a publicação do livro Marx & Keynes, posteriormente traduzido em todos os idiomas mais importantes do mundo, as teorias de Mattick vem a ser discutidas nas universidades e, mais importante, na esquerda. Nos Estados Unidos, no Japão e na Europa Ocidental, a reputação e o reconhecimento, recebidos com ceticismo, chegaram a ele depois do lançamento de Marx & Keynes.
Paul Mattick é uma figura muito peculiar: é difícil classificá-lo nas categorias tradicionais. Não dá para identificá-lo com um partido ou grupo político específico. Por toda a sua vida, ele permaneceu uma pessoa extremamente original e extremamente criativa e um filósofo independente. Mas não quero caracterizá-lo como individualista, só quero dizer que ainda que Paul Mattick fosse socialista no sentido mais amplo da palavra, ele sempre permaneceu longe das burocracias dos partidos de esquerda. Mattick sempre teve um ponto de vista autônomo e podia, assim, ter criticado as organizações operárias de seu ponto de vista. Neste sentido, direi que Mattick desenvolveu um papel bem importante para a esquerda; ficando de fora dos partidos políticos, que no fundo guiavam as ideias de seus próprios seguidores, e assim foi capaz de conduzir análises críticas muito pontuais sobre o que acontecia nos Estados Unidos.
Crítica da política
Entrevistador:
A tradição libertária do socialismo de Paul Mattick remonta a Rosa Luxemburgo e outros teóricos da esquerda socialista. Para Mattick, como para Rosa Luxemburgo, o proletariado não é por si a classe revolucionária agraciada com o dever histórico de abolir o poder burguês; em um longo processo contraditório, a classe operária, produto do capitalismo, mas também produtora deste sistema, assume apenas a possibilidade, em breves momentos históricos, de mudar as coisas profundamente.
Nestes períodos históricos, a alternativa ao socialismo é a barbárie; mas o socialismo, diz Mattick, deve vir de baixo, das massas, através da participação da grande maioria da população e os instrumentos desta democracia socialista são os conselhos, os sovietes, assim como ocorreu no início da Revolução Russa e na Alemanha.
Paul Mattick:
Os sovietes, isto é, os sovietes de fábrica na Rússia revolucionária, não nasceram espontaneamente. Não existe espontaneidade pura na sociedade, simplesmente porque os seres humanos chegam à ação através do pensamento, através da reflexão. A forma de organização dos conselhos operários era dada pela fábrica. O capital reúne as massas das fábricas, obrigando os trabalhadores a cooperarem. Esses trabalhadores que compreendem o papel organizacional da fábrica são, então, capazes de organizar até mesmo fora dela. Os sovietes camponeses, por exemplo, surgiram um pouco depois no campo e nasceram sobre a base da experiência dos conselhos operários. A fábrica, já em 1905, havia se tornado a base organizativa para as ações contra o czar e contra os capitalistas. Mesmo quando o proletariado não está organizado, quando não tem ou não pode ter sindicatos ou partidos, ainda é bem-sucedido em conduzir sua ação. Organizado na fábrica e pela fábrica, através do capital, é capaz de encontrar formas de organização adequadas. Na história recente do movimento operário até as revoltas dos trabalhadores poloneses recentemente, encontramos novamente esta constante da organização dos conselhos operários através da fábrica.
Entrevistador:
Portanto, segundo Mattick, a renovação do movimento operário passa pela recuperação da tradição antiautoritária e de sua forma organizativa mesmo quando não são explicitamente conhecidas como sovietes ou conselhos operários. Ademais, sem uma crítica desapiedada do socialismo autoritário e do comunismo burocratizado, sem uma análise das causas que levaram à degeneração da Revolução Russa, não será possível dar plausibilidade à perspectiva socialista.
Paul Mattick:
A Rússia era um país atrasado e não podia, portanto, parar nem econômica nem politicamente senão forçando o fenômeno do desenvolvimento da concentração de capital em um regime não concorrencial. Nas condições monopolistas do mercado mundial, era necessário criar um supermonopólio, mediante do qual se interviria mais diretamente nos mecanismos de mercado, tanto na Rússia quanto no campo internacional, de modo a levar a mesma existência da economia monopolista. Portanto, o capitalismo de Estado na Rússia é a resposta prática ao capitalismo monopolista que já existia no mundo.
Se bem que isso nunca era dito nestes termos. Os trabalhadores soviéticos logo compreenderam que estavam diante de uma nova classe. Esta nova classe não se reconhecia enquanto tal, já que o conceito de classe sempre esteve ligado ao conceito de propriedade privada e ninguém havia compreendido ainda que as condições capitalistas pudessem continuar a existir e se desenvolver mesmo na ausência do capital privado. Todas as políticas stalinistas foram impulsionadas pela necessidade de sustentar a nova classe, esta classe burocrática recém-criada e que tinha um interesse direto na conservação do status quo e na defesa de seus próprios privilégios, perpetuando uma política de opressão à custa dos trabalhadores e dos fazendeiros.
Toda sociedade de classe, tanto se ela se basear na propriedade privada e se a referida propriedade privada fosse eliminada pelo Estado, pressupõe privilégios em favor da classe dominante, privilégios que podem ser expressos economicamente, como no caso do capitalismo, ou em termos de poder político, como aconteceu na nova classe dominante soviética. As condições sobre as quais se sustenta a dominação de classe pressupõem que a classe operária deve permanecer em posição tal que não pode intervir nos mecanismos de decisão da sociedade. A classe operária é forçada a vender o almoço para comprar o jantar, não deve enxergar nenhuma oportunidade de se tornar autônoma, independentemente da hegemonia da classe dominante.
Paul Mattick Jr.:
Eu acho que o que distingue a obra de meu pai[8] é ele ter conseguido por toda sua vida manter ligados dois aspectos da tradição teórica marxista, aspectos que geralmente eram separados pelos epígonos de Marx: o aspecto econômico e o político. Para ele, o capitalismo é uma forma de organização social que cria por si próprio a base para uma sociedade futura; portanto, da análise do capitalismo devém a teoria da crise econômica. A crise econômica, enquanto crise social e política, incita as pessoas a criarem novas estruturas de coabitação social que surgem da necessidade mesma de crescimento do capitalismo. Neste contexto, Rosa Luxemburgo vem imediatamente à mente e, com ela, o movimento dos conselhos operários e teóricos de esquerda como Gorter e Anton Pannekoek. Na teoria de Paul, tudo isto está presente; além disso, encontramos a análise dos mecanismos modernos do capitalismo, desenvolvidos depois da II Guerra Mundial, através dos quais é possível compreender os tipos de luta da classe operária de caráter espontâneo.
Segundo Paul, o mecanismo econômico incita a classe trabalhadora a criar um movimento de classe que está inclinado à emancipação de todo o povo e é o movimento para ser revolucionário, não a ideologia que ele expressa em determinados períodos. Desta maneira, meu pai nunca acreditou nas ideologias de prosperidade e sempre tentou explicar como, a partir da prosperidade provisória e efêmera, assim como aquela dos anos 50 e 60[9], ele sempre redunda novamente na crise e, daqui, na revitalização do movimento político e, espero, na revitalização do movimento socialista.
Crise da economia política
Entrevistador:
O capitalismo moderno, segundo Mattick, ainda caminha de crise a crise, assim como era em seus primórdios. Em relação ao capitalismo analisado por Marx, no entanto, Mattick sublinha duas novidades fundamentais: em primeiro lugar, crises se tornaram crises globais e produzem enorme destruição, quiçá guerras reais; em segundo lugar, o Estado intervém na economia para limitar danos que o desenvolvimento competitivo que o capitalismo produz, sobretudo num nível social. A intervenção estatal provocou uma nova forma de economia mercantil, a “economia mista”; porém, para Mattick, a criação de um setor econômico que depende diretamente do Estado, por suas atribuições, tendo escolhido um setor que não produz para o mercado e que, portanto, permanece improdutivo, não resolve, no longo prazo, contradições do capitalismo, apenas atenua as consequências da crise, reduz o desemprego, mas atrasa os problemas de fundo que, inevitavelmente, apresentar-se-ão novamente. Segundo Paul Mattick, uma economia mista encontra seus próprios limites na necessidade de ter de aumentar o setor improdutivo da economia para fazer frente à crise à custa do setor privado, o único que produz lucros reais e que, portanto, é capaz de fazer com que o sistema funcione. Desta maneira, segundo Mattick, tanto no nível nacional como no internacional, se encontram duas tendências: uma que almeja a expansão do setor estatal, outra que tende a reduzi-la. Nesta clara contraposição, o capitalismo conhece seus próprios limites.
Paul Mattick:
Os limites da economia mista variam de país para país em razão da posição específica no âmbito da economia global. Estes limites devem ser postos em relação ao cronograma em que um determinado país pode se permitir aumentar a dívida pública e com sua capacidade de organizar a economia de maneira a conseguir pagar depois as dívidas. Caso a crise se estenda por um longo tempo em um sistema de economia mista, então há a possibilidade, hoje não mais apenas teórica, mas real, de que a crise seja acompanhada por uma inflação galopante. Não cresce somente o desemprego, mas também a inflação, e isso quer dizer que nos encontramos diante de uma desagregação progressiva do capital, um lento colapso, à medida que os instrumentos empregados para combater a crise tornam-se eles mesmos fatores agravantes da crise.
Esta situação já se concretizou na realidade. Por este motivo, hoje, não só o mundo capitalista, mas também as teorias econômicas desaguam em um estado de crise. A teoria capitalista, segundo a qual a contração dos lucros pode ser atrasada com uma política deficitária da despesa pública e com uma ampliação do crédito, não se prova válida há muito. Antigas leis sobre a sobreacumulação continuam a explicar seus efeitos, demonstrando, deste modo, que o capital não é capaz de encontrar uma maneira de regular seu próprio aspecto social e que a sociedade, portanto, ainda está à mercê das contradições provocadas pelo mercado e da lenta erosão derivada pelo mesmo processo de acumulação capitalista.
Entrevistador:
Paul Mattick sempre foi uma figura inconveniente; ele escolhia ser inconveniente, um trabalhador que por acaso chegara às fileiras intelectuais, que quis assumir o papel de crítica consciente do movimento operário. Por isto, sua análise do capitalismo e do movimento operário, análise fria e às vezes desapiedada, não oferece soluções reconfortantes. Mas para quem sente que é necessário renovar a esquerda, deve se confrontar com as ideias de Paul Mattick, com sua carga crítica, e até mesmo para aqueles que rejeitarem as conclusões, o confronto com sua teoria se torna uma passagem necessária para uma compreensão sem camadas ideológicas do mundo moderno, em sua compacidade, mas também em toda sua contraditoriedade.
Nesta longa entrevista Paul Mattick falou de si mesmo e de suas ideias; agora, seu realismo pessimista e a densidade de sua experiência pessoal permanecem acima de tudo um testemunho de uma crise de identidade, de ideias, de análises e de projetos em que encontram-se hoje a esquerda oficial e o movimento operário institucionalizado.
Simone Monet.
Alexi T.
M. S. Corgi
[1] A tradução desta entrevista foi feita a partir da tradução para o inglês e posteriormente revisada a partir do áudio original em [italiano]. A entrevista foi concedida por Paul Mattick em alemão e depois traduzida ao italiano e, nos poucos momentos em que o áudio alemão assume o primeiro plano, traduziu-se a partir dele ou se fez uso para conferir pequenos detalhes; Paul Mattick Jr. concedeu a entrevista em inglês, e adota-se o mesmo procedimento nestes trechos. Estas pequenas correções ou meros apontamentos estão indicados nas notas de rodapé como [n. t.]. As notas da tradução para o inglês são marcadas como [n. t. i.]. [n. t.]
[2] Estas edições são sempre indicadas entre parênteses e em itálico; algumas não contribuem em nada à leitura, mas foram mantidas. [n. t.]
[3] Bitola estreita refere-se aos transportes ferroviários cuja via possui uma largura inferior à considerada normal. [n. t.]
[4] A tradução italiana da entrevista, concedida em alemão, é vacilante quanto à palavra Arbeiter, utilizando ora operaio [operário], ora lavoratore [trabalhador], sem qualquer distinção de sentido entre as duas. Salvo quando é possível ouvir claramente o áudio alemão na entrevista, traduzimos operaio por operário e lavoratore por trabalhador. [n. t.]
[5] As Escoltas: Pessoas que embarcavam os imigrantes. [n. t. i.]
[6] Sacco e Vanzetti foram 2 anarquistas italianos acusados de matar dois homens durante um assalto. Ambos foram executados. Muitos os viam na época – e ainda veem – como inocentes. [n. t. i.]
[7] No áudio em alemão, Arbeiter, trabalhador; em italiano, operai. [n. t.]
[8] Em inglês, Mattick Jr. refere-se a seu pai como Paul. [n. t.]
[9] No áudio italiano, os anos 50, citados por Mattick Jr., foram omitidos. [n. t.]
Traduzido por Thiago Papageorgiou.
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